sexta-feira, janeiro 25, 2013

As declarações de António Borges


Vejam com atenção as declarações de António Borges, nomeadamente o segundo parágrafo:

 

“Os nossos compromissos, neste momento, são compromissos quase exclusivamente com a Europa. Nós já temos a economia equilibrada. Em muitos sentidos, já não precisávamos de mais austeridade nenhuma”.

Ao clarificar esta afirmação, António Borges avançou que Portugal não precisa, de facto, de mais austeridade: “[Austeridade] no sentido macroeconómico claro que não, porque já não temos défice externo”.

“É necessário cortar o défice público, é uma coisa totalmente diferente”. E, para conseguir a redução do défice público, o país não precisa de mais austeridade, mas sim de crescimento, defendeu o consultor do Governo para as privatizações.

“O essencial para evitar a bancarrota já desapareceu”, disse ainda o economista à Renascença.

 

Ou seja, António Borges explicita claramente o que nunca tinha sido dito – o objectivo da austeridade, e em concreto do aumento da carga fiscal, não era o combate ao défice público (que será feito essencialmente do lado da despesa, como manda a escola de pensamento do FMI) mas sim o combate ao défice externo.

O Governo tinha esse objectivo, que nunca foi explicitado nem evidenciado,  escondido pelo “som e fúria” em torno do objectivo aparentemente principal de redução do défice público para os valores acordados com a troika.

O aumento da carga fiscal não teve como objectivo principal o aumento de receita fiscal como seria normal para cumprir o objectivo da redução do défice público. Talvez por isso, quando em vez de aumento tivemos diminuição da dita receita, o governo não se mostrou preocupado nem mudou de estratégia, porque a receita fiscal não era o mais importante, ao contrário do que fomos levados a crer.

O verdadeiro objectivo do aumento fiscal era de facto reduzir o poder de compra dos portugueses  levando à redução do consumo interno, e a consequente redução das importações e inversão do défice externo. Mesmo à custa de recessão económica e desemprego, também eles absolutamente necessários para este objectivo.

 Como país membro da UE e no actual contexto da economia global, o governo não pode criar barreiras às importações para diminuir o défice externo – assim, decidiu fazê-lo por via fiscal interna. Propositada e conscientemente.

A austeridade, o desemprego e as falências de empresas não foram uma consequência infeliz mas inevitável e incontrolável da necessidade de ter o défice público abaixo dos 5%. Foram sim o objectivo principal da estratégia do governo.

O empobrecimento do país é de facto a grande reforma estrutural do governo.

Isto nunca foi dito, e é um bocado maquiavélico.

quinta-feira, abril 19, 2012

Auto contentamento

O super-controller Vítor Gaspar está claramente muito contente consigo próprio. Em NY resolveu proclamar o seu génio - afinal os investimentos públicos não estimulam a economia, "Portugal (leia-se ele próprio) deu uma lição de moral a quem assim pensa", e a economia portuguesa voltará a ser grande e forte apenas como resultado das políticas por ele implementadas com a ajuda e benção da chamada "troika". A falta de humildade é algo que pode ser desculpada nos génios mas nos medíocres funcionários como ele cai mal, é totalmente ridícula. Imagino a gargalhada geral (necessariamente silenciosa) que se deve ter seguido a estas declarações. Deitem fora os livros de economia, esqueçam Adam Smith, Keynes, Galbraith, Friedman. Chegou Vítor Gaspar, o homem que salva a economia portuguesa dando lições de moral ao mundo através do milagre da redução cega da despesa, de lançar mais 10% de população no desemprego em apenas um ano, de levar ao desespero o comércio porque não há poder de compra, de reduzir a receita fiscal pela via genial do aumento cego de impostos, de roubar partes de salário (sim, porque os chamados subsídos são asalário)de forma "temporária" que tende afinal a ser definitiva, de sobrecarregar os portugueses sem qualquer aviso e de forma ilegal com um imposto adicional de 3,5% (uma decisão digna dos senhores feudais, que lançavam novos impostos sobre o povo sempre que precisavam dinheiro para cobrir o seu despesismo), e ainda de (genialmente!) não atacar as grandes fortunas, os off shores, a evasão fiscal generalizada e os privilégios excessivos da minoria (desprotegida, presumo) de ricos que há em Portugal. Viva Gaspar, o genial!

terça-feira, fevereiro 21, 2012

Acontece

Depois de muito tempo sem perder acabámos de perder dois jogos seguidos.

Acontece. Foi mau? Foi. Mas acontece.

O importante agora é que se seguem mais três jogos muito complicados. O que é preciso é ganhar esses, porque pelos outros já não podemos fazer nada.

Só novas vitórias fazem esquecer as derrotas.

sexta-feira, outubro 22, 2010

Resposta a um texto anti-socialista

Este texto é uma resposta a um texto anti-socialista chamado “uma experiência socialista… em 1931” que anda há algum tempo a circular na net. Fiz o texto inicialmente como resposta via mail à enésima pessoa que me enviou o dito texto.

Segue a minha resposta, primeiro, e depois a reprodução do texto em causa.

Já tinha visto isto. É um texto pobre e falacioso de uma ponta à outra.

Se há princípio base do Socialismo é que toda a gente trabalha e produz, para criar riqueza. Na URSS, os trabalhadores mais produtivos até eram publicamente reconhecidos e condecorados – os “Heróis do Trabalho da URSS”, e até a “Ordem Lenine” nalguns casos.

Recordo que o princípio de distribuição de riqueza definido por Marx na sociedade socialista (não confundir com sociedade comunista, que seria um último estado de abundância e felicidade que como sabemos nunca se atingiu), esse princípio é “de cada um segundo a sua capacidade, a cada um segundo o seu trabalho”. Não conheço nada mais justo – o que é diferente de ser “igualitário” no mau sentido do termo, aquele que o texto lhe dá, em que toda a gente tem a mesma recompensa esforce-se ou não. Igualitário é esforço e mérito igual ser recompensado da mesma forma.

O que não há no Socialismo são mecanismos de acumulação individual de extrema riqueza, que só é possível quando a “recompensa” é totalmente desproporcionada do “esforço”, por via ou da pura exploração do trabalho alheio, conforme teorizado por Marx para a sociedade industrial, ou, mais modernamente, por via do mecanismo de “recompensa do risco”, nomeadamente nos mercados financeiros.

Confunde-se no texto o Socialismo com mecanismos de distribuição de riqueza que por vezes se criam para tentar distribuir mais a riqueza dentro dos sistemas capitalistas. Essas são tentativas bem intencionadas, mas nada têm a ver com Socialismo. É apenas capitalismo com mais impostos sobre a riqueza. E nesse sentido até concordo com as objecções que o texto faz; o que é totalmente falacioso é confundir essas tentativas “socializantes” em regime capitalista com o Socialismo.

De qualquer forma, não me parece que haja ou tenha havido nenhum país do mundo onde por via dessas medidas se verifique que “metade da população não precisa de trabalhar porque descobre que a outra metade irá sustentá-la”. É mais uma extrapolação abusiva e falaciosa.

De resto, qualquer pessoas concordará com a frase “é impossível multiplicar riqueza dividindo-a”. Mais uma vez, isso não tem nada a ver com o tema em discussão, e nunca nenhum teórico do Socialismo defendeu o contrário.

Quanto ao exemplo das notas é uma simplificação abusiva que também me parece não ter nada a ver com uma discussão séria do tema. Logo que se muda o pressuposto dizendo “Ao invés de dinheiro, usaremos as vossas notas dos exames.", está-se imediatamente a mudar o terreno da discussão para outro completamente descontextualizado e despropositado para a mesma, porque “notas de exames” não são riqueza, e porque à partida o esquema proposto só poderia levar ao tal resultado de “menor esforço possível”. Nunca nenhum teórico ou prático do Socialismo defendeu uma sociedade de “menor esforço”, a não ser se e quando alguma vez atingíssemos a tal “sociedade de abundância” que isso permitisse.

Finalmente, o que está na base deste texto simplista e pobre é outra falácia – a de que no capitalismo o esforço é sempre recompensado, ou seja, que os melhores e mais esforçados são os que mais e melhor são recompensados, e portanto as desigualdades económicas e sociais seriam justificadas por essa via. Todos nós sabemos que não é assim. Por cada Bill Gates há milhares de Abramovichs; e se calhar muitos outros potenciais “Bill Gates” que pura e simplesmente não tiveram a sorte do seu lado.



TEXTO ORIGINAL


Uma experiência socialista........ em 1931.
Um professor de economia da universidade Texas Tech disse que raramente chumbava um aluno, mas tinha, uma vez, chumbado uma turma inteira. Esta turma em particular tinha insistido que o socialismo realmente funcionava: ninguém seria pobre e ninguém seria rico, tudo seria igualitário e "justo".

O professor então disse, "Ok, vamos fazer uma experiência socialista nesta classe. Ao invés de dinheiro, usaremos as vossas notas dos exames."

Todas as notas seriam concedidas com base na média da turma e, portanto seriam "justas". Isto quis dizer que todos receberiam as mesmas notas, o que significou que ninguém chumbaria. Isso também quis dizer, claro, que ninguém receberia 20 valores...
Logo que a média dos primeiros exames foi calculada, todos receberam 12 valores.
Quem estudou com dedicação ficou indignado, pois achou que merecia mais, mas os alunos que não se esforçaram ficaram
muito felizes com o resultado!

Quando o segundo teste foi aplicado, os preguiçosos estudaram ainda menos - eles esperavam tirar notas boas de qualquer forma.
Aqueles que tinham estudado bastante no início resolveram que também eles se deviam aproveitar da media das notas. Portanto, agindo contra os seus principios, eles copiaram os hábitos dos preguiçosos. O resultado, a segunda média dos testes foi 10. Ninguém gostou.

Depois do terceiro teste, a média geral foi um 5. As notas nunca mais voltaram a patamares mais altos, mas as desavenças entre os alunos, procura de culpados e palavrões passaram a fazer parte da atmosfera das aulas daquela turma. A busca por ' justiça ' dos alunos tinha sido a principal causa das reclamações, inimizades e senso de injustiça que passaram a fazer parte daquela turma. No fim de contas, ninguém queria mais estudar para beneficiar os outros. Portanto, todos os alunos chumbaram... Para sua total surpresa.

O professor explicou que a experiência socialista tinha falhado porque ela era baseada no menor esforço possível da parte de seus participantes. Preguiça e mágoas foi o seu resultado. Sempre haveria fracasso na situação a partir da qual a experiência tinha começado.

"Quando a recompensa é grande", disse, o professor, "o esforço pelo sucesso é grande, pelo menos para alguns de nós. Mas quando o governo elimina todas as recompensas ao tirar coisas dos outros sem o seu consentimento para dar a outros que não lutaram por elas, então o fracasso é inevitável."

O pensamento abaixo foi escrito em 1931.

"É impossível levar o pobre à prosperidade através de leis que punem os ricos pela sua prosperidade. Por cada pessoa que recebe sem trabalhar, outra pessoa tem de trabalhar recebendo menos. O governo só pode dar a alguém aquilo que tira de outro alguém.
Quando metade da população descobre de que não precisa de trabalhar, pois a outra metade da população irá sustentá-la, e quando esta outra metade entende que não vale mais a pena trabalhar para sustentar a primeira metade, então chegamos ao começo do fim de uma nação. É impossível multiplicar riqueza dividindo-a."

Adrian Rogers, 1931


segunda-feira, fevereiro 02, 2009

Cinemateca em Fevereiro

Não é um mês com muitas surpresas, pelo menos para os cinéfilos mais atentos.

Continua o ciclo dedicado a Anthony Mann, com incidência este mês nos filmes negros que antecederam a sua fase mais conhecida. Quem não viu, veja – é tudo bastante bom. E ainda este mês. Já dois westerns, um dos quais o inicial do ciclo com James Stewart, “Winchester 73”; o outro, “The Furies”, a meio caminho da tragédia grega, com a grande Barbara Stanwick e a sua despedida do fora-da-lei mexicano que fora seu irmão, amigo, amante: “Till our eyes next meet”, diz-lhe ela, ele já com a corda ao pescoço.

Continua também o ciclo Clint Eastwood, entrado agora na fase mais conhecida do grande público, os seus filmes mais recentes, que dispensam apresentações. Dos filmes não relaizados por Clint, esses apresentados fora da ordem cronológica, merece chamada especial “Escape from Alcatraz”, o seu último filme como actor dirigido pelo seu mestre Don Siegel; e o filme de Cimino, “Thunderbolt and Lightfoot”, clint ao lado do maior actor americano da sua geração, Jeff Bridges. “Paint Your Wagon” é um musical – tenho muita curiosidade em ver, mas temo o pior, e o nome de Josh Logam na realização só adensa o meu receio, ele que parece ter sido grande no teatro mas que em cinema é habitualmente confrangedor (“Picnic”, por exemplo). Tenho boas recordações de “Tightrope”, que vi no Império na estreia, um bom policial com Clint numa personagem nos antípodas de Harry Callahan. E há ainda um dos “filmes com o macaco”, “Any Which Way You Can”; falta o outro, “Every Each Way But Loose”.

“Finalmente, Naruse!”, chama-se o ciclo dedicado ao cineasta japonês Mikio Naruse, título que não podia ser mais apropriado. Naruse não foi descoberto ao mesmo tempo de Mizogouchi, Ozu, Kurosawa, e só por isso provavelmente o seu nome não aparece mais vezes no panteão dos grandes mestres. Só vi três filmes, um dos quais o mais conhecido e que é exibido este mês, “Quando Uma Mulher Sobe as Escadas”; mas do que vi, arrisco dizer que estaremos perante um cineasta tão grande quanto os maiores do cinema japonês, ou seja, Mizogouci e Ozu (Kurosawa, desculpem-me, não está ao mesmo nível).

Outros filmes a merecerem chamada de atenção:

“Il Conformista”, Bertolucci, há muito não visto.
“The Covered Wagon”, James Cruze, um western mudo muito célebre e creio não visto por cá nos últimos muitos anos.
“The Blackbird”, Tod Browning, uma obra-prima do mudo, pertencente à inquietante e quase sempre genial fase de colaboração de Browning com Lon Chaney, “the man with a thousand faces”.
“Le Fantôme du Moulin Rouge”, René Clair, e os mudos de Clair são a redescobrir, para se perceber se a sua fama nesta altura é hoje ainda justificada – é um caso em aberto, o último que vi era decepcionante.

Todos os filmes que vão passar com Carmen Miranda, muitos deles não vistos – e atenção, para os mais distraídos, a essa obra-prima que é “The Gang’s All Here”, de Busby Berkeley, já fora da Warner, agora a cores e se possível ainda mais delirante, com as coreografias a libertarem-se definitivamente das “leis da física” impostas pelos corpos humanos a dançar e a submeterem-se apenas às “leis do cinema”, montagens feéricas de caleidoscópios impossíveis em cores inacreditáveis, onde Berkeley merece plenamente o que dele disse tantos anos depois Andy Warhol; se há filme de facto que antecipa a “pop-art” é este.

Não é de deixar em claro mais um ciclo dedicado a Bresson – enfim, todos nós já vimos tudo mas é sempre bom rever, e desta vez com um pretexto adicional; haverá a propósito de Bresson (ou a partir de Bresson) uma exposição de Rui Chafes e um livro de João Miguel Fernandes Jorge.

Bons filmes!

quarta-feira, janeiro 07, 2009

Sarar a Ferida

Três dias depois, do desastre na Trofa, já consigo estar minimamente recuperado. Neste momento, o sentimento que identifico é só um: estou muito zangado. Muito zangado com o nosso grupo de trabalho do futebol. E é bom perceber que pelo menos Rui Costa e Quique também estão, mas outros haverá também dentro do próprio grupo que o estão igualmente, e ainda bem.

Derrotas, e derrotas inesperadas, sempre houve. Mas nestes dias, ao falar com outros Benfiquistas, até alguns habitualmente menos militantes e menos atentos, percebi algo que há muito não presenciava. Esta derrota, na altura em que aconteceu, da forma como aconteceu, deixou em todos os Benfiquistas uma ferida profunda.

Há muito que uma equipa do Benfica não tinha dos seus adeptos tanto apoio, tanto carinho, e não transportava consigo tanta esperança como esta. Porque temos finalmente o Rui num cargo dirigente, temos um treinador que conquistou os adeptos desde o primeiro momento, um plantel de qualidade reconhecida e com dois ou três jogadores potencialmente de classe mundial. E por isso toda a esperança era, e é, legítima.

Ninguém pode fugir às suas responsabilidades. E eu, que acredito que "Todos Somos Benfica", vou também assumir as minhas, na modesta parte que me toca.

Explico-me. Desde sempre que tenho aqui apelado ao apoio incondicional à equipa. Compreendi o início irregular de época, temos uma equipa nova. Engoli sem protestar muito a miserável prestação europeia. Desvalorizei a eliminação da taça. Até suportei os pobres resultados e exibições nos jogos em casa com Setúbal e Nacional. E como eu outros, aqui na Tertúlia, noutros blogues, noutros locais. Se calhar fiz mal, fizemos mal. Se calhar confundiu-se compreensão com falta de exigência.

A partir de agora, portanto, a nossa Equipa continuará a ter da minha parte apoio total e incondicional, como sempre teve. Mas o grau de exigência passa a ser de "Tolerância Zero". Esta equipa está demasiado habituada a não ganhar, e parece acomodada a isso (Só 7 vitórias em 13 jogos no campeonato, 1 em 6 jogos na Uefa, 1 em 3 jogos na Taça - é mau para uma equipa deste nível e que representa o Benfica).

O nível mínimo que passarei portanto a exigir será vitórias e boas exibições em todos os jogos - seja contra que adversário for, em que campo for, em que competição for. E serei impiedoso sempre que isso não acontecer. É claro que sou só um e pouco valho no contexto geral do Benfiquismo, e que esta minha declaração de intenções pode parecer ridícula e quixotesca - mas pelo menos fico em paz com a minha consciência.

Para sarar esta ferida que trazemos desde domingo passado.

quarta-feira, novembro 05, 2008

Presidenciais USA

Barack Obama ganhou, como se esperava. E agora vai ter de estar à altura daquilo que todos esperam dele, incluindo muitos que nele não votaram e a generalidade do mundo fora dos EUA: que seja o melhor presidente Americano desde FDR.

A vitória não foi, em termos de votos, tão retumbante como muitos desejavam ou previam. Os últimos números que vi apontavam para cerca de 54% dos votos, contra 46% de McCain. Mas no colégio eleitoral isso traduziu-se numa vantagem esmagadora, reflectindo as vitórias que conseguiu na maioria dos estados, e na maioria dos grandes estados em particular.

O que ressalta no entanto é que os EUA continuam a ser um país assimétrico politicamente. Se em muitos estados o resultado foi equilibrado, vários houve nos quais quer Obama quer McCain conseguiram vitórias esmagadoras, de mais de 60% dos votos, o que diz bem das grandes diferenças que existem ainda entre o Norte e o Sul, as duas costas mais cosmopolitas e politizadas e o Midwest mais rural e tradicionalista. Sebem que se olharmos para os resultados só da Cãmara dos Representantes, vemos que no Leste, seja Norte ou Sul, e na Florida, muitos estados têm grande diversidade política, com muitos representantes dos dois partidos, o que acontece muito menos no Mid-West, West Coast e Texas, mais “monocromáticos”.

Obama, se virmos a mancha azul-vermelha, tem as duas costas (e todos os 13 estados fundadores, parece-me), parte do Mid-West e talvez a Florida, e ainda o Hawai; McCain, tem o resto – o Mid-East, parte do Mid-West, o Sul (os antigos estados confederados) e o Texas, e ainda o Alaska.

Houve por exemplo estados onde Obama conseguiu resultados melhores do que os candidatos do seu partido ao Senado e ao Governo Estadual, o que se pode considerar uma vitória pessoal do agora Presidente Eleito; mas também houve estados onde aconteceu o contrário, o que pode ser resultado do preconceito racial e/ou do “efeito Hillary”.

Vejamos alguns casos curiosos:

- Alaska – é o estado de Sara Palin, pelo que os republicanos conseguiram aqui uma maioria clara que contrasta com o maior equilíbrio nas eleições para o Senado e Câmara.

- Arkansas – Num estado predominantemente Democrata, vitória expressiva de McCain – talvez devido ao “efeito Hillary”, já que este é o estado de Bill Clinton. Mas Obama ainda assim ganha em Little Rock…

- California – vitória esmagadora de Obama. Curiosamente, neste mesmo dia, um referendo sobre o “casamento gay” parece estar a ser vencido pelos que se lhe opõem; enquanto que num referendo tentando impor limites ao direito ao aborto está a ser vencido pelos que se opõem aos ditos limites.

- Colorado – vitória de Obama, no mesmo dia em que um referendo propondo o fim da “affirmative action” está neste momento quase empatado.

- DC –vale como curiosidade; na capital da União, Obama tem 93% dos votos. Pelo menos na vizinhança não terá problemas com lealdade…

- Indiana – Obama poderá vencer, à justa, um estado onde os Republicanos elegem o Governador. Efeito Obama positivo.

- Louisiana – McCain vence claramente, enquanto o candidato Democrata vence para o Senado, num estado equilibrado entre “azuis” e ”vermelhos”. Efeito racial?

- Maine – Estranho estado. Obama vence, os Democratas vencem em todo o estado para a Câmara, mas os Republicanos vencem em todo o estado para o Senado. Poderá ser um caso de popularidade do senador Republicano, não sei.

- Missouri – vitória à justa de McCain, num estado onde os Democratas ganham confortavelmente o Governador e têm bons resultados para a Câmara. Aqui parece haver efeito racial.

- New York – nenhuma surpresa aqui, vitória esmagadora de Obama. Só o listo por ser o estado que é, e porque poderia haver aqui um “efeito Hillary” anti-Obama – que não aconteceu.

- Oregon – Obama ganha claramente onde o candidato Republicano poderá vencer para o Senado, e há equilíbrio nas eleições para a Câmara. Aqui, efeito Obama positivo.

- South Dakota – Aqui há claramente um “efeito anti-Obama”, seja racial ou Hillary. É um estado totalmente Democrata na Câmara; o candidato ao Senado vence claramente; uma proposta de limitação ao direito ao aborto é rejeitada em referendo; e ainda assim McCain ganhou.

- Vermont – vitória esmagadora de Obama, enquanto o candidato Republicano vence também esmagadoramente a eleição para Governador

- West Virginia – McCain vence claramente, enquanto os Democratas ganham de forma esmagadora o Senado e o Governador. Será um típico estado dos chamados “Southern Democrats” – e o efeito racial terá sido decisivo.

A conclusão que tiro é que Obama liderou uma grande “onda Democrata” que se reflectiu nas eleições também realizadas para parte do Senado e Câmara dos Representantes e alguns Governadores. À primeira vista no entanto o efeito anti-Obama ter-lhe-á custado os estados do Arkanasa, Louisiana, Missouri, South Dakota, onde perde apesar dos ganhos do Partido Democrata. Mas por outro lado houve um efeito pró-Obama, parte do qual também poderá ter sido de natureza racial, que lhe deu vitórias “a contra-ciclo” no Colorado, Indiana, Oregon e Vermont.