quinta-feira, março 29, 2007

VEM AÍ O BENFICA-PORTO

Vem aí o Benfica – FC Porto, talvez o mais importante dos últimos anos. Há dois anos, naquela que foi a sua pior época recente e uma das piores de todos os tempos, o Benfica arrancou para a vitória no campeonato com um empate no campo do Porto, depois da derrota na Luz consentida frente à coligação entre esta equipa e a de arbitragem.

Mas na Luz, na Catedral, na nossa Casa, este é o jogo contra o Porto mais importante dos últimos anos.

Eu sei que os meus correligionários me vão detestar por dizer isto, mas fundamental para o Glorioso é não perder este jogo. Eu não estou a dizer que devemos jogar para não perder, no sentido de não ter ambição de ganhar; estou a dizer que temos de jogar de forma a não perder, o que é diferente, ou seja, sem correr riscos desnecessários na necessária procura da vitória.

Se ganharmos, ficamos numa boa posição, como é óbvio. Dois pontos de avanço (que na prática são três) sobre o Porto são uma vantagem interessante; mas atenção aos deslizes, porque três pontos podem-se perder facilmente. Ainda temos jogos difíceis, nomeadamente a recepção ao Sporting, que nos últimos anos tem ganho mais vezes do que seria desejável no nosso estádio, e ainda a deslocação à Madeira. Sem contar com todos os outros. Ou seja, se ganharmos, óptimo, mas nada de desconcentrações nem euforias prematuras.

Mas se empatarmos o cenário é pior mas não é negro. Teríamos de recuperar dois pontos ao primeiro, o que não é impossível. Seria necessário uma campanha imaculada até ao fim, e esperar por uma escorregadela dos homens do norte. Um empate em Paços de Ferreira, por exemplo. Nada de impossível.

Uma eventual derrota, essa sim, parece-me definitiva. Recuperar cinco pontos nas sete jornadas seguintes acho que só se os jogadores do FCP fizerem greve e deixarem de aparecer aos jogos. Como isso não irá acontecer, o nosso objectivo teria de ser apenas defender o segundo lugar e respectivo acesso directo à Champions da inevitável investida do Sporting. Mas nem quero pensar nisso. Não vai acontecer. É que não vai mesmo.

No Domingo, espero como todos os benfiquistas que a equipa jogue bem e ganhe o jogo. E se não for possível jogar bem, então pelo menso que ganhe o jogo.

Espero que não haja mais lesões. Espero que o Anderson volte ao nível do ano passado, que o David Luiz não trema, que o Nelson esteja concentrado e consiga travar o Quaresma. Que o Petit tenha mais um remate inspirado, que o Simão esteja ao seu nível e jogue maravilhosamente, que o Rui Costa ainda possa jogar nem que seja alguns minutos e fazer uma assistência para golo. Que o Miccoli jogue finalmente um jogo completo contra o FCP, que seria o primeiro e provavelmente o último, e faça a exibição da sua vida. Que o guarda-redes, seja ele Quim ou Moretto, esteja sem falhas.

Espero que os adeptos apoiem a equipa e se esqueçam das habituais parvoíces de assobiarem os jogadores de que não gostam, caso estes joguem, seja o Moretto, o Beto ou outro qualquer.

Espero que o árbitro esteja bem, e sempre que erre seja a nosso favor.

Espero a Vitória.

Espero estar outra vez este ano no Marquês de Pombal a comemorar mais um título nacional da única equipa que o merece sempre.

Glorioso SLB!

terça-feira, março 20, 2007

THE GOOD GERMAN

“The Good German” passa-se supostamente em Berlim, no pós-guerra. Mas que Berlim é esta, realmente?

No filme, é uma Berlim recriada a partir de imagens de arquivo feitas na época e cenários bem elaborados. As personagens movem-se entre transparências e estúdio, a preto e branco, com aquela desenvoltura que era habitual no cinema clássico que Sodenbergh explicitamente invoca.

Para o espectador cinéfilo, alvo preferencial do jogo de aparências e referências do filme, Berlim é um local imaginário de reconhecimento cinéfilo. Primeira referência é “Foreign Affair”, de Wilder, com Marlene como modelo para Cate Blanchet. Mas também “Berlin Express”, de Tourneur, com um uso similar das transparências de imagens reais para “criar” artificialmente a cidade; até mesmo “The Third Man”, de Carol Reed e Orson Welles, que mesmo sendo passado em Viena está muito próximo na atmosfera criada e na floresta de enganos que envolve o protagonista. Mesmo, em contra-ponto perverso, o realismo de “Germania Anno Zero” de Rosselini nos vem à memória. E no final é Casablanca que é explicitamente citado – em rigor, é mesmo só aqui que me parece que se pode falar de pastiche.

Também para as personagens se multiplicam as “Berlims”, mais um lugar mental que um lugar físico. Cada uma das personagens como que constrói a sua cidade a partir das ruínas físicas da mesma, impossibilitando a geografia e as referências, e da sua própria memória ou vivência.

A primeira personagem que primeiro nos guia, ou nos desvia, pela voz-off, é a de Tully (Toby McGuire), que constrói a sua Berlim como espaço de uma liberdade e riqueza que antes nunca teve. Personagem talvez desprezível, vive na embriaguez de uma guerra que foi “the best thing that ever happened to me”. Acaba morto no rio, olhos abertos de espanto, perguntando talvez como foi possível a sua “dolce vita” acabar assim.

Jake (George Clooney) é a personagem de todos os equívocos, os que transporta consigo (jornalista “travestido” em capitão do exército por imposição deste) e os que se lhe deparam. Para ele Berlim é o lugar de regresso impossível a uma cidade que já não existe (vivera aí antes da guerra) e a um amor impossível de recuperar. Mas ele recusa-se a acreditar na evidência e vai de engano em engano vivendo a ilusão do regresso ao passado até ao brutal desengano final.

“Onde está Emil Brandt”? pergunta alguém a dado momento do filme. E essa personagem até aí apenas aflorada (é o marido julgado morto de Lena) transforma-se nesse momento no motor do filme. “McGuffin” hitchcockiano, sim, mas também no final personagem por direito próprio por breves instantes, numa Berlim que para ele começa como local de clausura e acaba pouco depois como local de morte. Ele é o portador de uma verdade da qual ninguém quer saber e a qual ninguém quer que outros saibam, guardião demasiado frágil de um Graal maldito que tem de ser destruído.

Lena. Finalmente, Lena. A paradoxal Lena. A única que consegue abandonar Berlim, a única que não consegue abandonar Berlim. Se sai fisicamente da cidade, nunca provavelmente conseguirá sair desse “lugar mental” que é a sua memória de Berlim e dos actos desumanos que aí cometeu. Tudo fez e tudo faz para sobreviver, mas é como zombie que sobrevive, numa não-vida em que vende o corpo, mas muito antes desistiu da alma. Não pode voltar a amar Jake, porque os zombies não amam, apenas continuam. Sobrevivem, sem estarem vivos. E quem não está vivo não ama.

Berlim, 1946. Lugar de cenários e transparências. Lugar de memórias e de equívocos. No final, é o aeroporto de Casablanca que aí se materializa, como por milagre, milagre do cinema. Como uma visão reconfortante para nos ajudar a suportar o horror da revelação final. O horror da possibilidade do Mal e da sua banalização pela cumplicidade das pessoas comuns, das pessoas como nós que numa dada altura apenas quiseram sobreviver.

quinta-feira, março 15, 2007

S. CARLOS: E AGORA?

Da surpresa passei à raiva. É a única forma que encontro para exprimir o meu estado de espírito face à demissão do director de S. Carlos pelos “aparatchiks” do ministério.

Pinamonti, ao assumir a direcção de S. Carlos, definiu um objectivo: colocar o nosso teatro de ópera a um nível europeu, colocá-lo no mapa dos grandes teatros de ópera, lugar que deverá ser sempre o seu, por ser o único do país e pelo seu passado histórico.

Em grande parte, esse objectivo foi atingido. Só alguém como Pinamonti, com o seu prestígio e as suas relações privilegiadas com muitos dos protagonistas da actual cena operática internacional, o poderia fazer, e fê-lo.

Pelos vistos, não é esse o projecto do ministério. A um dos poucos projectos portugueses de excelência, prefere o funcionário de serviço Vieira de Carvalho uma proposta vaga de “salto qualitativo” (para onde, e como?), de “criação de novos públicos” (esquecendo que isso tem vindo a ser feito, ainda este ano vamos ter cá a “Maria de Buenos Aires”, de Piazolla, se isto não é captação de novos públicos, o que será?), e pasme-se, de “turismo cultural”! Mas o que é isto? Vamos ter prospectos nas agências de viagens, “venha a Lisboa e veja a Carmen no S. Carlos”?

Não conheço a pessoa contratada para o cargo, actual director de ópera dos teatros de Colónia. Aliás, a julgar pelos depoimentos publicados, ninguém conhece. O S. Carlos passa de contratar uma pessoa de dimensão e prestígio internacional para um ilustre desconhecido, director de um projecto que me parece ser mais um projecto local de divulgação operática do que um projecto de excelência a nível europeu. De um gestor e líder, passamos a um funcionário público. Que, obviamente, tem a “vantagem” de não fazer sombra à mediocridade do funcionário Vieira de Carvalho e da sua chefe.

Pergunto-me onde estão as pessoas do PS e arredores que poderiam e deveriam ter agido para impedir que isto acontecesse. Onde estão frequentadores habituais do S. Carlos, como Vera Jardim, Augusto Santos Silva, Mediros Ferreira? Que faz Alexandre Melo, acessor de Sócrates para a Cultura? Estamos todos irremediavelmente entregues ao cinzentismo da actual equipa ministerial? Volta, Santana Lopes, estás perdoado. Até os “concertos para violino de Chopin” eram preferíveis a isto.

“Il faut combattre les idées vagues avec les images précises”. Imagens precisas de muitas produções de qualidade é a memória que nos fica destes últimos anos do S. Carlos. Ideias vagas, infelizmente, parece ser o que o futuro nos reserva.

quarta-feira, março 14, 2007

ADEUS, SENHOR PINAMONTI

Ainda estou chocado com o despedimento sumário de Paolo Pinamonti do Teatro de S. Carlos.

O coro de vozes prestigiadas que se levantou em defesa do actual director, em louvor do seu trabalho e contra a ministra e sobretudo contra a forma do despedimento é mais do que suficiente para me dispensar de acrescentar o que quer que seja, a não ser que apoio e subscrevo as posições já vindas a público.

Como assinante de S. Carlos, tenho muita pena de ver Pinamonti partir. Creio que é evidente a melhoria da qualidade média da programação durante o seu consulado. Melhoria essa que se traduz numa programação diversificada, em cantores de bom nível, por vezes mesmo excelente (donde salientaria a descoberta para muitos de nós da excelente soprano Dmitra Theodossiu), na aposta em grandes nomes da encenação, como Bob Wilson ou Graham Vick.

Escuda-se o ministério em ideias vagas e chavões gastos para justificar a sua atitude. Fala-se na “necessidade de uma equipa solidária com o projecto da tutela, que ninguém ainda percebeu qual é; na estafada “criação de novos públicos”, que não percebo como se pode fazer, já que só pode haver público novo se houver uma educação musical de base que o crie; não é o S. Carlos que pode inventar público onde ele não existe.

A questão central é que o ministério está entregue a administrativos sem qualquer nível ou capacidade para desempenharem as suas funções. A única missão parece ser o corte de custos, sem olhar a meios. Se este tipo de atitudes fosse tomada por um governo de direita, não nos faltaria o habitual coro de vozes protestando contra a “insensibilidade” e “falta de interesse” da direita relativamente às questões culturais. Como se trata de um governo PS, ainda visto por muita gente como “de esquerda”, muitas dessas vozes se calam.

E pergunto ainda: uma vez que o novo director só virá em Setembro de 2008, o que vai acontecer até lá? Concretamente, quem vai gerir o final desta temporada? E como vai ser a temporada 2007-08? Está garantida a continuidade do “Anel”, do qual faltam ainda levar à cena as duas últimas partes? Tudo questões por responder.

Se somarmos a esta decisão desastrosa o fim da “Festa da Música” no CCB, concluímos que mesmo o pouco de bom que ainda existia na música em Portugal está a ser destruído.

O que se seguirá?

quinta-feira, março 08, 2007

50 ANOS DA RTP

Eu, que pouco vejo televisão, acompanhei com alguma atenção os programas que entre sábado e ontem assinalaram os 50 anos da RTP.

A RTP faz parte da história portuguesa dos últimos 50 anos, e por extensão das nossas vidas. Deixando passar esta declaração de banalidade sentimentalista, o certo é que a emoção é quase inevitável perante algumas imagens e sons que por nós passaram, bem como por rever rostos conhecidos hoje com as marcas de mais dez, vinte ou trinta anos de idade.

Nada tenho contra a existência das televisões generalistas privadas. A mim, pessoalmente, pouco ou nada me acrescentaram, a não ser terem inventado a Catarina Furtado, mas até ela agora está na RTP (nunca percebi como se pode colocar a Bárbara Guimarães ao nível de Catarina, a Grande). Fora isso, nada a assinalar (ah!, e a minha melhor amiga também trabalha numa privada, quase me esquecia).

Sou dos que penso que a existência de um serviço público de televisão é útil, e creio que com altos e baixos, umas vezes melhor outras pior, a RTP tem cumprido a sua missão.

O pior da RTP tem sido alguma incapacidade de manter total independência face ao poder político. Mas aí as privadas não estão melhor; se não são dependentes do poder político, são-no do económico e dos grupos de pressão que as condicionam. E com menor visibilidade e controlo pelos cidadãos do que o poder oficial.

Outro aspecto a criticar é a tentação actual dos serviços informativos de acompanharem a moda populista das notícias do “neto que bateu na avó" e do “sr. Joaquim que não tem água em casa há 20 anos”. Tudo isto poderá ter cabimento em magazines, mas não num serviço noticioso de horário nobre. E lamento também a perca de independência, quer em termos de formato quer de conteúdo, dos serviços noticiosos da RTP2 face aos da RTP1. Que saudades dos tempos em que, mesmo quando a RTP1 servia obedientemente o poder, na RTP2 se tinham os melhores e mais independentes serviços noticiosos do país.

Para mim, o modelo de serviço público asssenta em num canal generalista, vocacionado para programas essencialmente destinado ao grande público, e um canal a que chamaria “multi-temático”, ou seja, que nele existam programas destinados a públicos minoritários e especializados, mas com a variedade necessária para que no conjunto de todos esses públicos se atinja também o maior número possível de pessoas.

O canal generalista deve ter boa informação, entrevistas políticas, séries de qualidade, produção própria em língua portuguesa. Deve oferecer tudo o que uma televisão generalista oferece, mas sem cair na boçalidade e vulgaridade. Mesmo no campo do “entretenimento familiar” há medidas possíveis de qualidade.

O segundo canal (nunca me hei-de desabituar de o chamar assim) continuaria na linha do que tem sido a sua actuação ao longo dos anos. Devem estar aqui as séries menos dirigidas ao grande público, a divulgação cultural, a divulgação científica e técnica (que tem estado bastante ausente), a ópera, o bailado, o teatro, o cinema “não mainstream”, e também porque não o desporto radical, a banda desenhada, a tauromaquia, a filatelia, a numismática, etc.

Tudo pesado, fico contente por existir a RTP.