terça-feira, setembro 26, 2006

DÉCIMO ANIVERSÁRIO DE "COISAS DO ARCO DO VINHO"

"Coisas do Arco do Vinho", a primeira loja de vinhos em Lisboa de grande qualidade e profissionalismo, situada no CCB, está a festejar o seu décimo aniversário, que se cumpre exactamente amanhã.

Deixo aqui a minha nota de parabéns, e reproduzo o texto que escrevi para a brochura comemorativa entretanto editada.

"Era um sábado à partida sem nada que o distinguisse. Quente e soalheiro, tanto quanto me lembro, mas nem disso já tenho a certeza. Fui ao CCB, como muitas vezes fazia e faço, e resolvi entrar na nova loja de vinhos sobre a qual já tinha lido.

Na altura o meu interesse mais a sério pelo vinho tinha despertado pouco antes, talvez um ano antes, talvez dois, mas o meu conhecimento sobre o tema era ainda bastante incipiente.

O que me agarrou desde logo naquela loja foi a extrema simpatia e profissionalismo do distinto Senhor que me atendeu, respondendo com paciência às minhas perguntas, imagino que algumas um pouco tontas, outras nem tanto. No fim, feita a compra, quis saber a minha opinião sobre a loja, eu apanhado de surpresa terei provavelmente dito duas ou três banalidades que foram escutadas e agradecidas como se se tratasse da opinião do maior dos especialistas.

Senhores assim, com “S” grande, há poucos. No caso da história acima, tratava-se do hoje meu amigo Francisco Barão da Cunha. Como se tal não bastasse, a loja tem não um mas dois Senhores de idêntica grandeza, o outro sendo o também hoje meu amigo “Juca” Oliveira Azevedo (nem o facto de ser do FCP o diminui, pelo contrário, acho é que engrandece o FCP, que não o merece, mas isso são contas de outro rosário).

Uma palavra também para o resto da equipa, a Ana, a Cláudia e o Zé, sempre de notável simpatia, boa disposição e profissionalismo.


Nestes dez anos, fui cliente ocasional, cliente assíduo, membro do painel de prova, participante em alguns jantares e passeios, amigo.

De tudo me recordo com prazer e orgulho. E também do muito que aprendi, e se hoje sei um pouco mais sobre vinho do que sabia há dez anos a esta Loja e aos seus dois Sócios também o devo.


Espero escrever um próximo texto na comemoração dos vinte anos. Até lá."

segunda-feira, setembro 25, 2006

BENFICA, À QUARTA JORNADA

Isto não está a correr bem. O empate em Paços de Ferreira foi decepcionante, e estamos perante mais um mau começo de época, tal como o ano passado.

Um dos problemas da equipa é a quebra de rendimento, da época passada para esta, de dois dos melhores jogadores, ainda por cima ambos defesas, Anderson e Léo. Essa quebra já se vinha notando, e no último jogo foram eles a enterrar a equipa, um com uma expulsão completamente estúpida e o outro com total culpa no golo do adversário.

Curiosamente, começo a gostar de Fernando Santos. Acho que tem armado bem a equipa, com os jogadores nos lugares certos, com ambição ofensiva. Falta que os jogadores comecem a corresponder, o que não tem acontecido não só devido às quebras de rendimento de alguns, como as que já referi, mas também devido às lesões e, sobretudo, ao nervosismo. Nervosismo que não só tem provocado falhanços, como, e isso tem sido o pior, a onda de indisciplina que atravessa a equipa, como há muito não se via.

É preciso que Fernando Santos e a Direcção tenham mão nos jogadores e lhes façam ver que atitudes como as de Petit e Léo são inaceitáveis. Se necessário, através de multas e castigos, caso as conversas e a persuasão se revelem insuficientes.

Não penso no entanto que haja motivos ainda para desespero. A equipa tem jogado quase sempre desfalcada (no último jogo faltavam quatro habituais titulares – Ricardo Rocha, Petit, Rui Costa e Nuno Gomes – e ainda houve uma lesão aos 30m.). Estamos com quase dois meses de época e Rui Costa e Simão nunca jogaram juntos. Simão e Miccoli ainda podem melhorar muito, tal como Léo e Anderson, de quem já falei e que seguramente não terão desaprendido.

Vamos ver como corre o jogo com o Manchester, onde a única ausência em princípio será a de Rui Costa. A situação é curiosa; o ano passado, toda a gente esperava a derrota do Benfica, dado o poderia do adversário; este ano, ninguém aceitará menos do que a vitória, face ao resultado do ano passado.

Eu acho que o empate poderá ser bom. Notem que se o Benfica conseguir duas vitórias e dois empates com Celtic e FC Copenhaga, e um empate com o Manchester, soma 9 pontos, que darão seguramente a passagem à fase seguinte da Champions; o ano passado bastaram 8.

Confiança, Benfiquistas, confiança é o que se pede. Confiança e realismo. Nenhuma equipa do Mundo é invencível, nenhuma está isenta de momentos menos bons. Os bons resultados aparecerão, tenho a certeza.

sexta-feira, setembro 22, 2006

COMPROMISSO PORTUGAL?

Foram divulgadas ontem as conclusões de novo encontro do “Compromisso Portugal”. Não li o documento, mas permito-me comentar algumas das medidas propostas no mesmo com base no que foi divulgado na comunicação social.

1) Propõe-se o despedimento de 200.000 funcionários públicos como forma de reduzir o défice. E, para não parecer muito mal, acrescentam a ideia peregrina de um plano de absorção gradual dos mesmos pela iniciativa privada.

Pergunto: num contexto de grande desemprego e pouco crescimento, como é possível pensar que 200.000 pessoas, e previsivelmente não as melhores nem mais qualificadas, podem ser absorvidas, assim sem mais nem menos, pelo sector privado? O que teríamos seria seguramente mais quase 200.000 novos desempregados; se considerarmos que cada um deles está integrado numa família de 3 pessoas, teríamos um impacto negativo no nível de vida de 600.000 portugueses, ou seja, cinco ou seis por cento da população. Acrescente-se a isto que o pagamento dos subsídios de desemprego sairia também do orçamento de estado, o que não parece ter sido levado em conta nos cálculos apresentados, e de uma área que é a mais frágil de todas, a segurança social.

2) Continuando pela referida segurança social, surge uma ideia ainda mais extraordinária. Os descontos de cada cidadão seriam canalizados para um fundo pessoal gerido pelo Estado, e no final da vida laboral cada um receberia o resultado do investimento das suas poupanças.

Isto significaria o fim do princípio da solidariedade, em que quem mais ganha suporta parte dos custos com os menos afortunados financeiramente. Pergunto então: com um modelo destes, para quê haver segurança social? Se é para cada um receber o produto do que ele próprio descontou, mais vale que cada um guarde o dinheiro e o invista como melhor lhe aprouver. Receio que seja isso mesmo que os proponentes da medida realmente querem.

Não sei se na notícia que li algo estava mal explicado, porque há ainda outra questão não explicada; com este modelo, como se garante a liquidez do sistema? Ou seja, se a partir de um dado ponto no tempo todos os descontos são encaminhados para contas pessoais, onde se vai buscar o dinheiro para pagar aos reformados, pensionistas, desempregados, etc?


3) Propõe-se a redução do IRC para 10 a 12,5%. Como princípio, não tenho nada contra, e percebo que isso possa dinamizar a economia, no sentido de que torna o investimento mais atractivo.

Mas, por um lado, mais investimento não significa melhor investimento, nem melhor qualidade no resultado desse investimento. Quando alguns dos promotores da iniciativa apontam o dedo, com razão, à falta de qualidade dos nossos empresários, para quê reduzir o IRC? Para que os mesmos maus empresários continuem a investir e a gerir da mesma forma errada, só que em mais quantidade? Ou para que pura e simplesmente metam mais dinheiro ao bolso, sem sequer o reinvestir? Não sei se vale a pena.

No actual contexto, também não me parece que esta redução possa ser feita sem impacto orçamental no Estado, como os proponentes afirmam. Afirmam, mas não explicam como.


Fico-me por aqui, sob pena de o texto ser demasiado longo. Para concluir, tudo isto me parece parco em visão estratégica, sem ideias verdadeiramente inovadoras, e com custos sociais elevados. Um Compromisso Portugal… dos pequeninos.

quinta-feira, setembro 21, 2006

TELEVISÃO EM PORTUGUÊS

Lembro-me perfeitamente que aqui há uns anos um dos temas de que se falava relativamente à televisão portuguesa era a ausência quase total de ficção portuguesa, e a”colonização” feita pelas telenovelas brasileiras.

Agora a situação modificou-se completamente, com grande parte do horário nobre das duas televisões privadas a ser ocupado por telenovelas portuguesas. A queixa agora prende-se com o baixo nível de qualidade desses produtos, sobretudo quando comparado com a qualidade demonstrada pelas… telenovelas brasileiras! Preso por ter cão…

Se o problema era a questão linguística, ou seja, o proporcionar às pessoas entretenimento na nossa língua, não há nada a apontar ao actual estado das coisas. Se a questão era a qualidade do produto, essa nada tem a ver com a nacionalidade de origem e a questão nunca deveria ter sido posta nesses termos.

Entendamo-nos; a televisão é um meio de entretenimento de massas, e é isso que proporciona e sempre proporcionará. Há exemplos contrários e louváveis, como o “Arte”, o “Channel Four”, até mesmo ressalvando as distâncias a nossa “RTP 2”. Mas serão sempre canais de nicho, e não são nunca formatos aplicáveis às televisões generalistas em canal aberto.

É claro que é possível ter uma televisão de entretenimento com um mínimo de qualidade, sem cair no nível baixo do “Fiel ou infiel”, “Big Brother” e etc.. O problema é, quem define o que é qualidade? Como fazer uma televisão rentável apenas com “produtos de qualidade”? E como conciliar tudo isso com o desejo de existência de uma grande percentagem de produtos, e especificamente de produtos ficcionais, na língua nacional?

Pessoalmente, nada tenho contra o entretenimento “de massas”; e entre a “qualidade” das telenovelas brasileiras ou das séries da BBC, e a “falta de qualidade” dos “Morangos..” e quejandos, enfim, sinceramente, tudo espremido, o diabo leve a escolha…

Por outro lado, a televisão como meio de difusão cultural parece-me pobre. Ver na televisão um grande filme, ou uma ópera, é-me penoso; a dimensão do écran, a fraca qualidade de som, torna a fruição impossível. Um programa de difusão cultural já consigo ver, mas nunca nada com a profundidade de uma conferência de nível académico. E mais facilmente devoro séries sobre séries no AXN do que fico a ver mais de alguns minutos de um Ford ou Hitchcock ou do “Don Giovanni” ou…

Ora se eu, que gosto de Cinema, e de Música, e de Teatro, não os consigo ver na televisão, como posso esperar que quem não está habituado a esse tipo de consumo cultural se possa interessar por ele através da televisão? Naquele quadradinho, como é que um espectador não informado e preparado distingue o “Rio Grande” de um episódio do “Bonanza”?

Também não me parece que possa ser a televisão a fazer aquilo que os nossos educadores, o sistema de ensino, a própria vivência social não fazem, isto é, despertar nas pessoas o interesse e o gosto por mais elevadas formas de expressão artística, e nomeadamente por aquilo que nesse campo é feito em Portugal.

Pelo menos, a existência de séries ou telenovelas ou outras ficções produzidas em Portugal tem o grande mérito de dar trabalho (e dinheiro) a actores portugueses, sendo que aqueles de entre eles que têm talento e interesse para fazer coisas mais sérias, teatro ou cinema, poderão fazê-lo sem a expectativa de passar fome, graças ao dinheiro proporcionado pela televisão.

Além disso, a presença num palco ou num filme de actores conhecidos da televisão poderão atrair espectadores que de outra forma não se interessariam por esses espectáculos.

E assim, sim, indirectamente, a televisão serve a Cultura.

Esperar mais do que isto é esperar o impossível.

quarta-feira, setembro 20, 2006

IMPOSTOS OU UTILIZADOR-PAGADOR? : NOTAS PARA A DISCUSSÃO

Está sempre activo o debate em torno das questões do financiamento da Segurança Social, do Serviço Nacional de Saúde, da Educação, e outras relacionadas, e a esse propósito gostaria de deixar aqui o meu contributo para esta discussão, centrando-me para já apenas nas questões relacionadas com os serviços prestados ou subsidiados pelo Estado (saúde, educação, transportes, etc) e deixando para outro texto a questão específica da Segurança Social.

Também não me ocuparei aqui das questões muito específicas das actividades culturais proporcionadas ou subsidiadas pelo Estado, embora de facto muito do que aqui escreverei também às mesmas se possa aplicar. Mas há de facto especificidades destas que aqui não cabem, sob pena de o texto não se conseguir focalizar num objecto concreto.

Passo então do preâmbulo necessário ao texto propriamente dito.

O modelo clássico de Estado Social, ou Estado Providência, baseia-se num princípio simples; os serviços de primeira necessidade (saúde, educação, transportes, abastecimento de água, luz, etc) são subsidiados pelos Estado, sendo que uns são fornecidos gratuitamente e outros a baixo custo. Por sua vez, o Estado angaria os fundos necessários através de um sistema de impostos onde, à partida, quem mais ganha mais paga. Está portanto subjacente a este modelo a noção de solidariedade, onde os cidadãos contribuem não só para o seu próprio benefício mas também suportando parcialmente os custos que o sistema tem com os cidadãos mais carenciados. Da mesma forma as regiões mais ricas suportam parcialmente o desenvolvimento das menos ricas e menos desenvolvidas.

A este modelo contrapõem algumas correntes de pensamento mais economicistas com o princípio do utilizador-pagador. Quem usa determinados serviços paga por eles e não há o direito de se pedir que quem não necessita dos ditos serviços esteja a pagar a utilização dos outros.

Em defesa desta tese, esgrimem-se algumas vezes argumentos populistas, do estilo “porque é que quem ganha muito não há-de pagar pelos serviços de saúde, (ou pela universidade, etc) se pode?”. O argumento não faz muito sentido, porque neste modelo quem mais ganha mais paga de impostos e portanto já paga a sua utilização do sistema público.

Ou então “Porque é que os cidadãos de Lisboa, ou do Porto, hão-de pagar pelas auto-estradas de Trás-Os-Montes, ou da Beira Interior, que muitos deles nunca usarão na vida”?

No limite, este princípio levado ao extremo levaria à diluição ou mesmo destruição do princípio de solidariedade (entre pessoas, entre regiões) subjacente ao sistema, e que eu diria que é um princípio base de natureza civilizacional, antes de mais nada.

E no entanto…

Sendo realista, há que reconhecer que:

- Somos um país pobre e não é exequível que todos os serviços públicos sejam integralmente financiados pelo orçamento de Estado, ou seja, pelos impostos;

- O princípio do utilizador-pagador já é aplicado há muito; a água, a luz, o gás de cidade, os transportes públicos, são serviços públicos onde parte do custo é pago pelos utilizadores proporcionalmente à utilização, e nestes casos o princípio é aceite por todos.

Parece-me portanto que a implementação de um sistema misto generalizado a todos estes serviços públicos, à semelhança do que já acontece nos exemplos que apontei acima, seria o ideal.

- Parte dos custos suportados pelo Estado;

- Parte suportado pelos utilizadores em função da utilização;

- Valores fixados deverão ser realistas, face ao rendimento médio real dos cidadãos, mas sem se aplicar o princípio de proporcionalidade nos custos conforme o rendimento;

- Cidadãos abaixo de um determinado limite de rendimento, variável em função do serviço em causa, estariam isentos (o limite para se estar isento das taxas de saúde seria diferente do limite para se estar isento das propinas universitárias, etc);

- A proporcionalidade ao rendimento continuaria a ser apenas garantida pelos impostos.


Obviamente que para garantir quer a saúde financeira do sistema, quer os princípios de justiça e solidariedade que lhe são subjacentes, duas coisas são fundamentais:

- Eliminação de despesas supérfluas do Estado, para que os cidadãos não sintam, como sentem hoje, que pagam impostos para fins inúteis;

- Investir na eficiência dos serviços, para que os cidadãos sintam, como sentem por exemplo nos países nórdicos, que têm efectivamente retorno dos seus impostos;

- Combater a fraude e evasão fiscais, para que todos suportem o sistema, e não só alguns;

- Explicar o modelo aos cidadãos, para que todos percebam o que pagam e porquê;

- Tratar o modelo de um ponto de vista global, com equilíbrio entre todas as suas componentes, para minimizar as necessidades de paliativos, remendos e medidas avulso;

- Elaborar um plano de médio/longo prazo que permita prever a evolução das receitas directas e o seu impacto numa eventual redução de impostos, sempre mantendo o desejável equilíbrio financeiro.


Chegado aqui, penso que não disse nada de realmente novo. Tudo o que enunciei me parece óbvio. Mas sê-lo-á mesmo?

O problema é que falar, ou escrever, é fácil. Difícil é realizar. Mas nada disto me parece irrealista nem irrealizável, se houver vontade.

segunda-feira, setembro 18, 2006

FECHO DE ESCOLAS

Vi há dias uma reportagem interessante num canal de televisão sobre o fecho de escolas consideradas sem condições nalgumas aldeias e vilas.

As razões apontadas pelo Ministério são das mais válidas. Se as escolas não têm condições para oferecer um ensino com um mínimo de qualidade, mais vale para bem das crianças e do seu futuro que estas se desloquem para outros estabelecimentos onde essa qualidade possa ser assegurada. Não tenho nada contra estas razões, nem disponho de informação que permita contestá-la.

Mas desta reportagem, descontando o habitual populismo destas peças televisivas, ressaltavam algumas situações que levam a reflexão e me parecem interessantes.

O mais óbvio e imediato prende-se com a necessidade da deslocação física. Crianças que tinham a escola ao pé de casa passam a ter de se deslocar 10 ou 20 km. São provavelmente uma ou duas horas por dia perdidas em deslocações. Tempo esse que será retirado ao habitual tempo de estudo, ou de brincadeira, ou de estar com os pais e a família. Não trará esta situação uma provável quebra de rendimento escolar, para além do aumento de cansaço físico e intelectual, e perca de qualidade de vida?

Mas a questão que mais me surpreendeu foi a relacionada com a própria ausência física das crianças, do ponto de vista daqueles que ficam, e não só dos familiares. “Se as crianças se vão embora, só cá ficam os velhos”. “As crianças fazem falta”. “A gente passava na escola e via os filhos e as outras crianças e era uma alegria”. Ou seja, do ponto de vista da comunidade, esse conceito que esteve esquecido e que agora parece aos poucos ir ressuscitando, a ausência física das crianças é um rude golpe.

Perante isto, começo a pensar; mas afinal, se o problema é a falta de condições, porque não se investe de forma a criar essas condições e manter as escolas em funcionamento inseridas nas comunidades que delas precisam? Mesmo que isso implicasse o encerramento provisório por um ano, talvez dois, mas que se lançassem as bases para uma solução mais duradoura. Porque se o problema existe e está identificado, é seguramente possível encontrar solução.

O verdadeiro problema, mais uma vez, é essencialmente financeiro. É mais barato fechar escolas do que pô-las a funcionar. E contra isso, no mundo actual, nada a fazer.

quinta-feira, setembro 14, 2006

O BENFICA, PRIMEIRAS IMPRESSÕES DA ÉPOCA

Ainda nada tinha aqui escrito sobre o Glorioso. Um bocado perplexo com este início de época algo atribulado, não sabia bem o que dizer. Não sei se já sei, mas vou tentar.

Para começar, devo esclarecer que à partida não confio muito em Fernando Santos. Parece-me um bom treinador, sem dúvida, mas incapaz de lidar com a pressão que existe sempre no Benfica de ter de ganhar todos os jogos, e ainda ter de jogar bem, e sabe-se lá mais o quê, para satisfazer a maior, mais exigente e provavelmente mais irrealista massa adepta do país.

No entanto, espero sinceramente estar enganado; gosto sempre de confiar em qualquer treinador que o Benfica escolha.

A forma actual da equipa parece-me ter sido prejudicada por um início de época inesperadamente estranho; a equipa teve de estar pronta a competir a alto nível mais cedo que as outras equipas portuguesas, para depois se encontrar na indesejável situação de fazer dois jogos seguidos e a seguir estar três semanas paradas, recomeçando com um jogo de elevado grau de dificuldade, no Bessa. Foi o desastre que se sabe, e sobre ele não digo mais nada, porque nem sequer vi o jogo e a seguir recusei-me mesmo a ver os habituais resumos. Só na segunda-feira, já mais calmo, vi os golos, apenas os golos, num resumo de todos os golos da jornada dado pela TVI.

Dito isto, acho que:

- Não devemos desvalorizar a passagem à fase de grupos da Champions; foi muito importante e conseguida de forma categórica. E não me venham dizer que o Áustria Viena é uma equipa fraca. É campeão da Áustria e alguma categoria tem. Pior que o Anderlecht não será, e há dois anos foi o que se viu.

- Ainda não tivemos a equipa na máxima força. Rui Costa e Simão, os dois mais influentes jogadores, ainda não jogaram juntos um único jogo. Miccoli ainda não jogou um jogo oficial. E todos sabemos que o plantel do Benfica não tem uma riqueza que permita colmatar sem percalços ausências deste vulto.

- Quanto ao jogo de ontem, ficou um amargo de boca por alguma falta de ambição, mas acho que a equipa foi realista. Provavelmente, neste momento o Benfica não tem condições para se impor ao FC Compenhaga sem correr riscos. E correr riscos implica a possibilidade de perder, e isso sim seria inadmissível. Tudo somado, foi talvez a melhor opção; se foi suficiente ou não só as contas finais dirão.

Esperando, como sempre, melhores dias, continuo atento e vigilante. Como sempre.

quarta-feira, setembro 13, 2006

QUE MARAVILHA! "THEY ALL LAUGHED"EM DVD, FINALMENTE!

Recebi hoje da Amazon a notícia de que em 17 de Outubro será editado em DVD o filme de Bogdanovich, “They All Laughed” (chamado por cá”Romance em Nova Iorque”). O meu coração exulta.

De todos os filmes dos últimos 30 anos, este é talvez o que mais amo, depois de “One From the Heart”, de Coppola. Por sinal, ambos foram fracassos críticos e de bilheteira. O filme de Coppola parece estar a ser agora algo lembrado e recuperado criticamente. O de Bogdanovich nem isso. Ficou na história pelas piores razões, por ser o último filme (e o único importante) de Dorothy Straton, grande amor de Bogdanovich assassinada pelo marido pouco tempo depois. Ninguém quis distribuir o filme depois disso, e Bogdanovich arruinou-se financeiramente e arruinou a carreira.

Nem sei por onde começar a enumerar as maravilhas deste filme. Os actores estão todos em estado de graça (curiosamente, ao lado dos dois veteranos Ben Gazzara e Audrey Hepburn - (foi também o seu último filme -, nenhum dos extraordinários jovens actores do filme fez carreira que se visse). A câmara de Bogdanovich move-se pela cidade com uma elegância que faz lembrar Ophuls. Cada gesto, cada frase, cada plano, cada sequência, é uma pequena pérola a observar com atenção e a saborear lenta e gulosamente:

- a mão sobre o peito que levanta o casaco, simulando o palpitar do coração, quando o detective Charles vê Dorothy Straton (Dolores Martin no filme) pela primeira vez, gesto de que lembro quase todos os dias desde então;

- a sequência do ringue de patinagem, com as hesitações, avanços, recuos, na abordagem do mesmo Charles a Dorothy (Dolores);

- as personagens deliciosas das filhas de Ben Gazzara, interpretadas pelas ilhas de Bogdanovich, e os extraordinários diálogos que protagonizam;

- Ben Gazzara a dormir, literalmente, com a loura taxista: “I’ve slept with a twenty-year old virgin”, diz ele a um amigo no dia seguinte;

- todas as sequências entre Gazzara e Audrey;

- a energia electrizante das intervenções, cantadas e faladas, da personagem de Christy Miller, a cantora, descendente directa da Rosalind Russell de “His Girl Friday”…

(e tantas outras coisas)

Num tempo em que em Nova Iorque ainda era possível filmar com esta leveza e quase inocência sem atrair as iras do politicamente correcto ou os choros das carpideiras oficiais, esta é a última das grandes comédias românticas. Bogdanovich filma Dorothy Straton com um amor que recorda Minnelli a filmar Judy Garland em “Meet Me in St. Louis”. E esse amor contagia todo o filme. Não é um filme “sobre” o Amor, é um filme que tem o Amor (o Amor físico homem-mulher, não o Amor em qualquer sentido metafísico ou religioso), como própria essência.

Todas a personagens percorrem o filme como que embriagadas de um estado de felicidade contagiante, mesmo quando estão tristes (“ce nést pas gai, le bonheur”). Charles, o detective tímido, ama Dolores, a bela loura que devia vigiar, à distância e sem esperança, até que a conquista finalmente, como tinha de ser. Ben Gazzara e Audrey Hepburn amam-se com um amor sem futuro, mas nem por isso deixam de ser felizes, enquanto podem; mesmo após a separação final, fica essa felicidade triste que acompanha as belas e dolorosas recordações. A loura e linda taxista, a quem chamam Sam, provavelmente ama Ben Gazzara, ou talvez não, que não a ama, ou talvez sim. E é feliz. Christy, a cantora, a eléctrica Christy, que ama a ideia de encontrar um homem que ame, encontra-o finalmente, na pessoa de José, o homem perfeito, pois nem sequer fala inglês (interpretado por Sean Ferrer, filho de Mel Ferrer e Audrey, no seu único papel no cinema).

Bogdanovich é mesmo o único cineasta clássico tardio (não, não é o Clint Eastwood). O último de quem se pode dizer, como ele dizia de John Ford e como Bénard da Costa disse dele numa folha da Cinemateca aqui há uns anos, “os seus filmes conhecem-se e amam-se”.

Vejam esta maravilha quando puderem e digam-me se tenho ou não razão.

segunda-feira, setembro 11, 2006

CIGARETTE BURNS

“Thank you… for this”. É a última frase que se ouve no filme. Nada teria de especial, não fosse o facto de ser proferida por um anjo, de o destinatário do agradecimento estar morto, e de o “this” a que se refere serem as bobines da única cópia de um filme.

“Cigarette burns” é o último filme de John Carpenter, feito para a série de televisão “Masters of Horror”.

Um programador cinéfilo é chamado por um coleccionador que o incumbe de encontrar a única cópia de um filme maldito, “La Fin Absolue du Monde”, que só fora exibido uma única vez no festival de Stiges e tinha provocado cenas de indizível violência entre os espectadores. Aceite a incumbência, parte numa busca que o levará numa espiral descendente às profundezas do inferno. Do seu inferno pessoal.

Tudo se constrói numa sucessão de encontros entre aquele que procura e uma série de estranhas personagens, cada uma com alguma relação com o filme. E o resultado de cada encontro é um degrau mais na descida do protagonista ao encontro do seu destino, como no filme negro. Mas também uma peça mais no “puzzle” que é a personalidade do realizador do filme, já morto. “Rosebud”?

Desconcertantemente, a solução é evidente, quase prosaica; é a pessoa mais óbvia que tem a desejada cópia, e perguntamo-nos porque não começou o inquérito/busca precisamente por ali. A resposta será “porque não”. Porque não tinha de ser. Porque estava escrito no destino que tinha de ser assim, porque só assim faz sentido. É o caminho que conta, não a chegada.

E quando chega o final, literalmente, percebemos que a grande personagem “Carpenteriana” do filme, parente ao mesmo tempo de “Snake Plisskens” e de Michael Myers, é precisamente a que está ausente, o realizador do filme maldito.

Dou por mim a pensar que com este filme assumidamente cinéfilo, eu diria quase insuportavelmente cinéfilo, Carpenter fez o seu “Lé Mépris”.

quarta-feira, setembro 06, 2006

JACQUES BECKER

A Cinemateca Portuguesa, este mês, homenageia muito justamente, por ocasião do centenário do seu nascimento, um dos maiores cineastas franceses de sempre, hoje algo esquecido: Jacques Becker.

Becker filmou entre 41 e 62, depois de na década de trinta ter sido assistente do maior de todos os cineastas, Jean Renoir, em oito filmes.

Da colaboração com o Mestre, ficou muito da sua forma de tratar as personagens com um amor e carinho muito especial, e o gosto pelos ambientes populares e as pessoas que os habitam.

No entanto, em Becker há uma visão talvez mais realista das personagens, pois não as pinta sob uma perspectiva lisonjeira nem escamoteia os seus defeitos; o amor de Renoir pelas suas personagens leva-o normalmente a mostrá-los sob uma luz que os torna naturalmente simpáticos e amáveis, no sentido literal do termo; em Becker nem sempre é assim; ele ama as personagens apesar dos seus defeitos, por maiores que sejam, e aí reside a sua forma pessoal de humanismo. John Ford e o seu humanismo católico também não andam longe, embora estilística e tematicamente tudo os separe.

No extraordinário “Goupi mains rouges”, que vi ontem numa sala com quinze pessoas presentes, Becker traça um retrato impiedoso do meio rural francês nos anos 40. A mesquinhez, avareza, ignorância, crueldade, violência física e psicológica, as pequenas tiranias, tudo nos é dado a ver e ouvir. Mas progressivamente vamos percebendo o contexto que provoca estes comportamentos, vamos vendo algum lado bom, até que no final, quando a personagem que dá nome ao filme faz a sua declaração de amor aos camponeses, declaração que claramente é de Becker, nós já estamos completamente do lado das mesmas personagens e totalmente receptivos a essa declaração de amor.

A trilogia de Paris, “Antoine et Antoinette”, “Rendez-vous de Juillet” e “Édouard et Caroline”, filmes ainda a exibir neste ciclo, antecipa a Nouvelle Vague em dez anos. O texto inserido no programa da Cinemateca explica bem porquê. Personagens jovens, filmagens nos locais, leveza de câmara. Penso que acima de todos Truffaut bebeu muito aqui, e também Rohmer.

O filme final, “Le trou”, é uma obra-prima absoluta. Distingue-se bastante dos restantes por se passar num universo fechado, no caso uma prisão, e é um retrato belíssimo de um grupo de prisioneiros que tentam uma fuga. Becker recusa quer uma abordagem psicológica quer o ascetismo de Bresson em “Um condamné à mort s’est échapé”. O que nos dá é um retrato destes homens mas sempre condicionado aquela situação precisa e ao objectivo que perseguem. Que me lembre, nada sabemos das suas vidas passadas nem do que os levou ali. Tudo nos é dado com um tom quase de reportagem, de uma precisão maníaca, para usar um termo que o próprio Becker se auto-aplicou. E somos quase seus companheiros na cela, solidários com eles, até ao desfecho final.

Vi muitos outros filmes , o famosíssimo “Casque d’or”, “Touchez-pas au grisbi”, o lindíssimo “Montparnasse 19” que Ophuls planeou mas não pode filmar porque morreu, e que foi o primeiro filme que vi de Becker, creio que precisamente no ciclo Ophuls, há vinte anos. Tudo o que vi é muitíssimo bom. É uma pena que este ciclo desperte tão pouco interesse do público.

terça-feira, setembro 05, 2006

A CINEMATECA, BÉNARD DA COSTA E AUGUSTO M. SEABRA

A propósito da eventual, e por agora não concretizada, substituição de João Bénard da Costa na Presidência da Cinemateca Portuguesa, e do artigo que sobre o tema na altura Augusto M. Seabra escreveu no jornal "Público", enviei ao mesmo jornal um texto em forma de carta para publicação.

Como essa publicação nunca aconteceu, reproduzo aqui esse texto, com algumas alterações de pormenor justificadas por um melhor conhecimento meu de alguns factos.

"A PROPÓSITO DA EVENTUAL SUBSTITUIÇÃO DE BÉNARD DA COSTA NA PRESIDÊNCIA DA CINEMATECA PORTUGUESA E DO ARTIGO DE AUGUSTO M. SEABRA SOBRE O MESMO TEMA


Começo por dizer, porque me parece importante para o tema em causa, que tenho 44 anos e desde 1981 que sou frequentador assíduo da Cinemateca Portuguesa. Por “assíduo” quero dizer que nestes 25 anos frequento entre 150 a 200 sessões por ano na sala da Cinemateca.

Tal como eu há um pequeno grupo de frequentadores habituais, amigos e conhecidos (e alguns desconhecidos), alguns frequentadores ainda há mais tempo do que eu; no total, devem ser uns 15 ou 20 “fiéis” que nos últimos anos têm acompanhado regularmente a actividade da Cinemateca Portuguesa.

E é por isso que me sinto no direito, mais do que outros mais mediáticos do que eu, de exprimir a minha opinião sobre este tema. Sublinho que é a minha opinião estritamente pessoal.

1) Sobre a substituição de Bénard da Costa


Acho que, independentemente do excelente trabalho que JBC efectuou na Cinemateca, chegou a hora da substituição. O limite de idade é o pretexto perfeito, porque permite uma saída honrosa, “em alta”, e perfeitamente justificada.

Não creio, ao contrário do que escrevia Manoel de Oliveira num artigo no Público há uns dias a propósito deste tema, que haja pessoas que devam eternizar-se nos cargos. Pelo contrário. Quanto mais meritório o trabalho efectuado, mais importante é uma saída no tempo certo.

A Cinemateca tem uma boa equipa de profissionais, nomeadamente na área da Programação, que poderá continuar o seu excelente trabalho (sim, porque JBC não trabalha sozinho, ao contrário do que parece transparecer de algumas opiniões) com ou sem JBC. Aliás, a eventual saída de JBC poderá dar espaço a ideias novas e novas formas de trabalhar que até agora poderiam estar impossibilitadas por uma liderança muito personalizada e provavelmente asfixiante de opiniões divergentes.

Embora eu pessoalmente me reveja quase integralmente no gosto pessoal e nas escolhas de JBC, reconheço que há público seguramente para áreas em que JBC pouco ou nada apostou, como sejam o documentário, o cinema experimental, as curtas e médias metragens, a animação, o cinema contemporâneo que habitualmente não passa nas salas comerciais.

Veja-se o êxito do Indie Lisboa, do Festival de CM de Vila do Conde, do Cinanima até das sessões da Geniuzastare/Zero em Comportamento no Cine222. A Cinemateca pode abrir-se a essas novas áreas, inclusive colaborando activamente com quem já nelas trabalha e nelas tem experiência.

Quanto às personalidades que constam no abaixo-assinado, não creio que a esmagadora maioria dos nomes mais sonantes sejam frequentadores assíduos da Cinemateca, e nem mesmo esporádicos. A maioria deles nunca lá os vi, e se é certo que não estive presente em todas as sessões efectuadas, penso que por amostragem posso deduzir que pouco ou nada frequentaram aquela sala (o que aliás é extensivo à maioria dos críticos de cinema presentes e passados da imprensa portuguesa, generalista ou especializada).

Claro que esse facto não lhes retira legitimidade para defenderem a continuidade de JBC; mas é importante perceber, acho, que se trata de solidariedade para com a pessoa de JBC, e não para com a Cinemateca enquanto instituição, cuja realidade muito provavelmente desconhecem.

Um novo Presidente, capaz de manter o prestígio da Cinemateca entre os seus pares internacionais, que conheça minimamente a casa, que dê continuidade ao trabalho efectuado mas se possa abrir para ideias novas, parece-me a solução adequada. Eventualmente apoiado num Vice-Presidente com um perfil de gestor, que se ocupe das áreas administrativa, financeira, gestão de pessoal, relação com os clientes/espectadores, etc.

E até arrisco nomes: Manuel Fonseca (para mim, de longe a melhor hipótese), José Manuel Costa, João Lopes, Jorge Silva Melo, Mário Jorge Torres, João Mário Grilo.

E também arrisco nomes de quem eu, pessoalmente, não gostaria de ver no cargo, se me permitem a ousadia: Augusto M. Seabra, Eduardo Prado Coelho, Jorge Leitão Ramos, António Pedro Vasconcelos.


2) SOBRE O ARTIGO DE AUGUSTO M. SEABRA


Há vários anos que AMS escreve sobre a Cinemateca. E que tece críticas ferozes à gestão de JBC. É um direito que lhe assiste. Só há uma coisa que AMS raramente faz; é ir à Cinemateca ver filmes.

Quando ele diz no seu artigo “frequento a Cinemateca” não está efectivamente a mentir, mas não creio que lá tenha ido mais de 20 ou 30 vezes nestes últimos 25 anos, e já estou a dar uma larga margem por cima (não estou a falar da sala da Gulbenkian, mas da sala ou salas da Cinemateca propriamente dita).

Suspeito há muito que AMS deseja ardentemente ser Presidente da Cinemateca (percebo isso perfeitamente, eu próprio também gostaria). Também isso é um direito que lhe assiste. Que os Deuses do Cinema não o permitam, é o meu voto.

Estou de acordo com AMS quanto diz que chegou a altura de JBC se afastar. Também me parece óbvio que não há nenhum “affaire Bénard” sequer remotamente comparável ao “affaire Langlois” (tal como a luta anti-CPE não foi nenhum Maio 68). E é verdade, como também referi acima, que a maioria dos signatários do abaixo-assinado pela continuidade de JBC não são frequentadores da Cinemateca; mas, como já disse, o mesmo se aplica a AMS.

Já não estou de acordo com a desvalorização que AMS procura fazer do papel desempenhado por JBC e pela Cinemateca nestes muitos anos.

Depois de termos visto Ford, Hawks, Walsh, Truffaut, Mizoguchi, Ozu, Griffith, Sirk, Vidor, Ophuls, Demy, Stroheim, Wilder, Godard, Fellini, Antonioni, Buñuel, Whale, Browning, Rohmer, McCarey, Capra, Cukor, agora Mamoulian, e ainda Cinema Italiano Mudo, Inglês, Chinês, Soviético, Indiano, musicais, westerns, ficção científica, milhares de obras algumas nunca vistas, não se pode dizer que a maior contribuição de JBC foram os ciclos de Cinema Americano na Gulbenkian!

Não é seguramente culpa nem de JBC nem da Cinemateca se o público, e nomeadamente algum público VIP, aderiu às sessões da Gulbenkian, onde o”beautiful people” cultural pode ver e ser visto, e nunca aderiu na sua maioria à sala da Dr. Félix Ribeiro, muito mais modesta, e onde quem vai o faz geralmente por simples amor ao Cinema.



Termino aqui a minha contribuição para o debate em torno deste tema. Espero que a solução encontrada seja tal que permita que a Cinemateca Portuguesa continue a ser o que é, uma das Instituições Portuguesas de cujo trabalho nos podemos todos orgulhar.

Viva o Cinema!"

segunda-feira, setembro 04, 2006

O FIM D'"O INDEPENDENTE"

Este texto devia realmente ter sido escrito há vários anos. Porque há muito que “O Independente” que nos entusiasmou nos primeiros anos tinha acabado, sobrando apenas o nome e pouco mais.

No início, era sobretudo a personalidade na altura invulgar e fascinante de Miguel Esteves Cardoso (que será feito dele? não pergunto pela pessoa, mas pela “persona” jornalística e crítica desaparecida há muito),o brilhantismo dos seus textos, a irreverência e o humor. Tudo (enfim, quase tudo) o resto parecia feito à imagem mas simultaneamente viver à sombra daquele que aparecia como o rosto e a alma do jornal.

Completavam o “produto” alguns colaboradores de excepção como João Bénard da Costa, Vasco Pulido Valente, Paulo Portas, talvez outros de que não me lembro.

Apesar de ser assumidamente de Direita, o jornal não se revia nas posições de defesa do anterior regime da Direita tradicional e da imprensa a ela ligada, e a inteligência, irreverência e frontalidade assumidas faziam esquecer, a um leitor de Esquerda como eu, o posicionamento ideológico.

Foi com base no jornal que nasceu uma candidatura de quase sucesso de MEC ao Parlamento Europeu, que ao que me lembro obteve mais de 4% dos votos e quase foi eleito. Conheço gente de variados quadrantes políticos que nele votou, todos de faixa etária até aos 35 anos. Até eu votei nele. Sempre respeitei a inteligência e o humor, duas coisas que MEC tinha (ainda terá?) para dar e vender.

Seguiu-se a mais séria fase “Paulo Portas” e o período do anti-cavaquismo militante. Que me lembre, só “O Independente” e depois Pedro Abrunhosa afrontaram realmente o poder cavaquista e a quase unanimidade nacional em seu redor.

Tudo isso se perdeu depois, o Portas brilhante dos combates jornalísticos deu lugar ao político calculista futuro líder do CDS/PP, o jornal foi ficando um pouco à deriva, depois mais e mais, até que se perdeu, chegavam uns fogachos aqui e ali, mas cedo chegou a um ponto de retorno impossível, e foi o fim real.

O fim oficial foi na 6ª feira 1 de Setembro de 2006. Alguns anos tarde de mais.