sexta-feira, outubro 27, 2006

O TEATRO-CIRCO

Li hoje no “Público” que reabriu o Teatro-Circo em Braga. Eis algo que me deixa feliz. Vivi em Braga entre 77 e 81, e muitas vezes vi filmes nesta sala, muito bonita mas então algo degradada.

Braga na altura pouca ou nenhuma oferta cultural tinha, mas apesar de tudo, ao contrário de outras cidades, tinha algumas salas de cinema. E até um Cine-Clube, do qual fui sócio, e que cumpria a função de apresentar filmes disponíveis no mercado português mas que não passavam comercialmente na cidade.

A sala do Teatro-Circo é uma sala antiga, bastante bonita, e era a única sala da cidade com um écran de grandes dimensões, o que para mim, chegado então da Lisboa do Tivoli, Império, São Jorge, Monumental, era um facto importante. Nunca gostei das mini-salas e mesmo ao Quarteto ia apenas pela obrigação decorrente de lá se exibirem filmes únicos.

As restantes salas de Braga eram três pequenas salas estúdio, uma das quais no próprio Teatro-Circo. O cine-Clube usava também uma destas mini-salas, já que não possuía sala própria. Lá vi o “Mon Oncle”, o “Chinatown”, o “Sweet Movie” do Makavejev, que revi há dias em DVD numa edição brasileira, Makavejev hoje esquecido, na altura cineasta polémico, o “Sweet Movie” está datadíssimo mas continua interessante, e os posteriores acontecimentos na Jugoslávia permitem hoje leituras na altura insuspeitadas.

Lembro-me no Cine Clube do pendor didáctico, no final queriam por força que as pessoas ficassem para debater o filme, eu escapava-me sempre sorrateiramente, nunca tive pachorra. Muitos anos depois, ouvi o Lobo Antunes numa entrevista televisiva falar sobre isto, também ele detesta, lembro-me perfeitamente de ele dizer esta coisa extraordinária, “os filmes não se debatem, vêm-se e ficam a habitar em nós como fantasmas”. Quem me dera ter eu dito isto, pensado isto.

Fantasmas, sim, disso sei eu, muitos comigo habitam. Um amigo meu uma vez disse-me “eu tenho fantasmas, mas tu és uma casa assombrada”. Foi há talvez vinte anos, nunca mais me esqueci desta frase, foi talvez a frase mais certeira que alguma vez alguém disse sobre mim. Entretanto o meu amigo morreu, é ele próprio um fantasma que hoje me habita, coisa que na altura não lhe passaria pela cabeça, nem a mim.

Bolas, que longe estou de Braga em 77 e dos seus cinemas. Regresso, como se diz, “à vaca fria”. Havia o S. Geraldo, um cinema grande mas com uma programação de série Z sem grande interesse (pel menos para mim, naquela altura, a começar a descobrir o cinema “de qualidade”). Já em 1980, abriu então o inevitável “grande” Centro Comercial, com o respectivo “multplex” da Lusomundo, e o panorama da exibição alterou-se radicalmente, pelo menos em termos quantitativos; eram, já não me lembro, 6 ou 8 salas, ainda lá estão. Todas as outras creio que fecharam entretanto.

Na altura, um filme ficava em Braga só dois ou três dias, era preciso inventar tempo para ver o que era essencial. No Teatro-Circo lembro-me que vi o Close Encounters do Spielberg, o Star Wars, não me lembro o que mais, a programação em geral não era muito interessante mas estes filmes de “grande espectáculo” em geral era lá que passavam. Mas, além do grande écran, era a única sala a ter aquilo a que na altura estávamos habituados, lembram-se, um foyer, um bar, espaços amplos junto às salas.

Estou muito curioso para ver como ficou, tenho de ir a Braga um dia destes.

quarta-feira, outubro 25, 2006

AINDA A LEI ELEITORAL

Depois de uma troca de mails com um amigo meu leitor deste blog e especialista nestas questões, e a quem desde já agradeço, cheguei à conclusão de que talvez o meu post anterior sobre este tema, ao tentar ser extenso e o mais completo possível, seja menos claro naquilo que é essencial.

Vou tentar portanto clarificar um pouco, pelo que em seguida apresento um resumo do sistema que proponho e exemplos da aplicação do que chamei “método directo”.


1) Resumo do Sistema Eleitoral proposto


- 80% a 90% dos deputados eleitos em círculos concelhios (concelhos demasiado pequenos serão agrupados com outros); cada círculo poderá ser ou uninominal ou plurinominal mas com voto nominal, conforme a sua dimensão (eleição pelo que chamo "método directo"; ver post anterior)

- 10% a 20% eleitos em círculo nacional, lista fechada, método de Hondt e boletim de voto separado - (a que chamo "método indirecto") - por um lado permite que o eleitor escolha aqui um partido sem considerações de "voto útil"; por outro lado corrige algumas distorções na proporcionalidade decorrentes do "método directo".


2) Exemplos da Aplicação do “Método Directo”


A existência de círculos plurinominais de pequena e média dimensão, a par dos uninominais, tem para mim vantagens quer sobre o sistema puro de círculos uninominais quer sobre o actual sistema. Sobre o primeiro, tem a vantagem de diluir o efeito perverso sobre os pequenos partidos. Sobre o segundo, a votação nominal permite aos eleitores escolher efectivamente os deputados e não apenas una lista fechada.

Além disso, nestes círculos cada partido apresentará não uma lista fechada com os n deputados a eleger, como acontece hoje nos círculos distritais por Método de Hondt, mas um nº de candidatos que será normalmente menor que n e que serão votados nominalmente. Este facto obriga os partidos a apresentar candidatos de qualidade e que efectivamente lutem pela eleição.

Exemplifico:


2.A) Caso 1 - Círculo com 20 deputados (por exemplo, concelho de Lisboa)


Os grandes partidos apresentarão provavelmente um nº de candidatos entre 8 e 12, tentando eleger a maioria deles.

E os partidos mais pequenos (CDS, BE, outros) apresentarão provavelmente cada um apenas 2, ou mesmo 1, candidato, tentando assegurar a sua eleição pela concentração de votos.



2.B) Caso 2 - Círculo com 3 deputados e dois partidos hegemónicos


Cada um destes dois partidos deverá apresentar 2 candidatos, sendo que naturalmente cada um deles elegerá o mais votado e o terceiro deputado será disputado pelo segundo nome de cada um deles.

Isto obrigará os quatro candidatos elegíveis a um real empenho na campanha.


2.C) Caso 3 - Círculo com 3 deputados, com um partido grande mas outros três com hipótese de eleição de deputado


Aqui, provavelmente, cada um dos quatro partidos irá apresentar só um candidato, lutando directamente os quatro pelas três vagas, o que há partida garantirá que dois dos três partidos mais pequenos elegerão um deputado (coisa que não aconteceria nunca se o círculo fosse dividido em quatro círculos uninominais, onde provavelmente o partido maior ganharia três ou quatro dos lugares).

Se o partido maior se sentir muito forte e quiser arriscar, apresentará dois candidatos para tentar eleger ambos, correndo no entanto o risco, em caso de quebra eleitoral, de não eleger nenhum devido à dispersão dos votos.


2.D) Caso 4 – Círculo uninominal


Existirão estes círculos sempre que um círculo eleitoral tenha uma dimensão correspondente à eleição de um só deputado.

Aqui aplica-se o método tradicional, existente no Reino Unido e outros países; cada partido apresenta um candidato pelo círculo e é eleito o mais votado.

terça-feira, outubro 24, 2006

PROPOSTA DE ALGUMAS NOVAS REGRAS NO FUTEBOL

Deixo aqui algumas sugestões para novas regras de futebol, com o objectivo de privilegiar o futebol de ataque e o espectáculo em si.


1) Fora de Jogo

O objectivo da lei do “fora de jogo” foi o de evitar que houvesse jogadores que ficassem estáticos no ataque à espera que a bola lá caísse para poderem marcar golo (aquilo que em português vernáculo se chama “ficar à mama”). Não foi o de criar complicado exercícios oftalmológicos para árbitros e auxiliares, nem o de beneficiar a equipa que defende em situações onde um “fora de jogo” milimétrico representa uma normal situação de jogo e não uma vantagem desleal.

Proponho:

- Criar uma zona chamada “zona de ataque”, delimitada pelo prolongamento até às linhas laterais da linha de demarcação da grande área;

- Desde que a bola seja jogada dentro desta “zona de ataque”, deixa de haver “fora de jogo”.


2) Novo livre


Em situações em que é travado um jogador, ou travada uma jogada com mão na bola, fora da área mas em situação de “quase golo”, proponho a criação de um novo livre semelhante ao “livre directo” existente no hóquei em patins: bola no local da falta, marcador onde quiser atrás da linha da bola, guarda-redes onde quiser dentro da pequena área, todos os outros jogadores atrás da linha de meio-campo, todos os jogadores se podem movimentar livremente a partir do momento em que o árbitro apita.


3) Novo cartão

Para se poder continuar a penalizar disciplinarmente jogadores que incorram sistematicamente em incorrecções mas sem prejudicar desnecessariamente as suas equipas, limitando as situações em que uma equipa fica com menos do que onze jogadores, prejudicando a competitividade e o espectáculo, proponho que:

- Nos casos de faltas até aqui punidas com cartão vermelho, mas que sejam faltas técnicas ou que não ponham em risco a integridade física dos adversários (mão na bola, protestos, falta leve mas a impedir situação de golo, etc), deve ser mostrado um cartão (chamemos-lhe “cartão azul) pelo qual o jogador punido terá de abandonar o jogo mas poderá ser substituído se a sua equipa ainda tiver direito a substituições;

- Idem para situações de segundo cartão amarelo, sendo que nestes casos se as duas faltas punidas forem de alguma gravidade, deverá o árbitro substituir o segundo amarelo por vermelho directo caso entenda que o comportamento do jogador justifica expulsão.


4) Desempate por “penáltis”

Proponho a substituição da série de cinco “penáltis” por uma série de livres semelhantes ao definido no ponto 2), com a diferença de a bola ser colocada num ponto pré-definido do campo (centro do terreno, ou um ponto a definir no primeiro terço do meio-campo) e de no campo só poderem estar o marcador do livre e o guarda-redes adversário. O livre é considerado finalizado se:

- for golo;
- a bola sair do campo;
- a bola for agarrada pelo guarda-redes durante cinco segundos;
- o guarda-redes fizer falta sobre o marcador (expulsão do guarda-redes, e repetição do livre com novo guarda-redes, que terá de ser um dos jogadores da equipa ainda em campo no final do jogo; à segunda falta no mesmo livre, ou terceira em livres diferentes, é decretada a derrota da equipa faltosa).


5) Substituição do guarda-redes

Em caso de lesão do guarda-redes após a sua equipa ter atingido o limite de substituições, deve ser permitida a substituição do mesmo.

Complementarmente, se em qualquer altura o guarda-redes for assistido por um período seguido de cinco minutos, deve o árbitro obrigar a equipa à sua substituição.

Idêntica regra se aplicaria no caso de ao guarda-redes ser mostrado o "cartão azul" definido no ponto 3) acima.


6) Cronometragem

A cronometragem do jogo, dentro do espírito de "jogo útil" tal como definido nas actuais regras, deve ser feita pelo 4º árbitro que deverá comunicar por sinalética visível as paragens de cronómetro que efectua e no final de cada parte o tempo extra a conceder. Sempre que as condições técnicas o permitam, e obrigatoriamente em jogos de ligas principais e provas europeias, deverá existir no estádio um cronómetro que evidencie o tempo oficial de jogo.

quinta-feira, outubro 19, 2006

UMA PROPOSTA DE LEI ELEITORAL

Não sou, já o disse, um grande entusiasta do parlamentarismo, que não considero uma inevitabilidade num regime democrático.

Mas na actual conjuntura gostava de dar o meu contributo sobre um tema muito discutido, que é o do sistema eleitoral, e nomeadamente a questão “método de Hondt vs. Círculos uninominais”.

Ambos os métodos têm vantagens e inconvenientes por demais já apresentados e discutidos, pelo que me dispenso de o fazer aqui.

Penso que um bom sistema seria um sistema misto, que conjugasse as principais virtudes de ambos e tentasse limitar os seus defeitos. À semelhança, aliás, do que existe na Alemanha, embora o que eu proponho tenha diferenças substanciais em relação a este.


PROPOSTA DE SISTEMA ELEITORAL

PRINCÍPIO GERAL

Parte do Parlamento (80 a 90%) seria eleito por um método a que chamarei “método directo”, em círculos eleitorais tão pequenos quanto possível e tendencialmente uninominais (já lá vou ao detalhe). O restante seria eleito em círculo único nacional pelo método de Hondt.


O MÉTODO DIRECTO

Deverão ser acautelados os seguintes princípios:

- Deve ser respeitada a organização administrativa existente ;
- Deve ser impedido um desenho de círculos eleitorais que favoreça esta ou aquela força política;
- Não devem ser criados círculos eleitorais desligados da realidade e sem identidade visível.

Chamando “E” ao nº eleitores inscritos e “D” ao nº de deputados eleitos pelo “método directo”, será desejável que o rácio de eleitores por deputado esteja entre (E/Dx0,9) e (E/Dx1,1). Admito que os coeficientes possam ser mudados se se verificar a impossibilidade prática de cumprir os coeficientes mais apertados.

A unidade mais pequena de constituição dos círculos eleitorais deve ser o concelho. Sempre que for possível fazer corresponder um círculo a um concelho, este princípio deverá ser aplicado.

Sempre que for possível a criação de círculos uninominais este princípio deverá ser aplicado.

Um concelho não poderá ser dividido em, nem por, vários círculos. Não poderão ser agrupados num mesmo círculo concelhos não adjacentes ou pertencentes a distritos diferentes.

Desta forma:

- Todos os concelhos cujo nº de eleitores esteja entre E/Dx0,9 e E/Dx1,1 (ver acima) serão um círculo eleitoral uninominal;
- Concelhos maiores serão círculos plurinominais, com um nº de deputados a eleger determinado pelo seu nº de eleitores, devendo ser respeitado na medida do possível o rácio acima referido;
- Concelhos menores serão agrupados com outros adjacentes e do mesmo distrito de forma a formar círculos preferencialmente uninominais ou plurinominais tão pequenos quanto possível.

Nos círculos uninominais, cada partido pode apresentar um candidato e vence o candidato mais votado a uma volta.

Nos círculos plurinominais, cada partido pode apresentar um nº máximo de candidatos igual ao nº de deputados a eleger, mas pode se quiser apresentar menos. A votação será nominal, devendo nos boletins de voto constar a identificação quer dos candidatos quer dos partidos que representam. Serão eleitos os X candidatos mais votados, em eleição também a uma volta.


MÉTODO INDIRECTO

Os deputados serão eleitos em boletim de voto separado, num círculo único nacional e pelo Método de Hondt. As listas fechadas e incluindo um igual número de suplentes serão da responsabilidade dos partidos.

Só poderão apresentar listas para a eleição por este método partidos que concorram a pelo menos 90% dos círculos eleitorais do “método directo”.


SUSBTITUIÇÃO DE DEPUTADOS

Não será permitida a substituição de deputados eleitos pelo “método directo"

Em caso de força maior (morte, doença grave) serão realizadas eleições intercalares no círculo em causa.

Os deputados eleitos pelo “método indirecto” poderão ser substituídos temporária ou definitivamente a seu pedido ou dos partidos pelos quais foram eleitos, sendo que a vontade expressa do partido prevalece para o caso apenas destes deputados.

quarta-feira, outubro 18, 2006

BENFICA, APÓS GLASGOW

Depois da vitória em Leiria, alguns Benfiquistas embandeiraram em arco. Agora é que era, voltámos a ser grandes, etc. etc.

Depois da derrota de ontem, voltou a depressão. É estranho como se passa tão depressa de um estado a outro. Acho que todos os benfiquistas são maníaco-depressivos no que ao nosso Clube diz respeito.

Acho que é preciso ter alguma noção das realidades algum equilíbrio. Nem o Leiria é o Celtic, nem o Benfica é o Barcelona. Bons e maus resultados acontecem a todas as equipas do mundo, e à nossa também, sendo que o Benfica é já uma muito boa equipa, creio, mas não ainda uma equipa de topo mundial. O que significa que contra adversários de valia equivalente como é o caso dos escoceses, qualquer resultado é possível. Mesmo o anormal resultado de ontem.

Desde o início que me pareceu que descrever o nosso grupo na Champions como “acessível” era um disparate. O Celtic é campeão da Escócia, líder do campeonato neste momento, está em boa forma e raramente perde em casa. O Manchester é líder do campeonato inglês e, ao contrário do ano passado, não está em crise, antes pelo contrário.

Em crise de forma estão por exemplo alguns dos adversários mais sonantes dos nossos rivais, como o Inter, a fazer um campeonato bem abaixo das expectativas e da valia dos seus jogadores, e o Hamburgo, actualmente penúltimo classificado do campeonato alemão. Mas tal não acontece, repito, com o Celtic.

Voltando ao jogo de ontem, não me parece que o Benfica tenha jogado mal, nem que lhe tenha faltado ambição e atitude. Pelo contrário, talvez tenha pecado por ambição a mais, que lhe toldou a organização e clarividência e permitiu um golo como o segundo do Celtic, num contra-ataque após dois cantos a nosso favor, e uma clara oportunidade de golo não concretizada. O adversário recupera a bola e a equipa está totalmente desposicionada e sofre golo. Como Trapattoni se irritava, e com razão, com estas situações.

Essencialmente, a equipa perdeu não por ter jogado mal ou com medo mas porque falhou onde não podia. Falhou a organização defensiva em lances capitais e falharam os remates, doze dos quais só dois à baliza, e como sabemos nenhum golo. E porque o adversário foi melhor. Talvez não “3-0” melhor, mas melhor ainda assim.

Também me parece preocupante a tendência da equipa para se desconcentrar à primeira contrariedade. Aconteceu com o Boavista, com o Manchester, com o Celtic. A equipa ou baixa os braços, o que é inadmissível, ou, como ontem, cerra os dentes mas tem uma atitude tipo touro, atira-se para a frente mas perde clarividência e organização. Creio que é um ponto a corrigir com urgência com trabalho técnico.

Contra isto, batatas. Mas também não me parece que haja motivos para desespero. E, caramba, se não formos aos oitavos da Champions, qual é o drama? Acontece aos melhores. Só no fim se pode e deve avaliar uma época.

terça-feira, outubro 17, 2006

O CONTROLO DE CUSTOS DO ESTADO

Já aqui manifestei a opinião de que, num país pobre como o nosso, será necessário (atenção: não acho desejável, mas necessário) que parte dos custos com serviços essenciais como a educação e a saúde sejam suportados pelos utentes, em função da utilização dos mesmos, e não apenas pelos impostos.

Acho necessário porque caso contrário teria de haver um aumento de carga fiscal para além dos limites toleráveis, sobretudo para as pessoas de rendimentos médios (que aliás em Portugal são bastante baixos). Para além disso, há o já conhecido efeito moderador que estes custos têm na utilização indevida, abusiva ou excessiva desses serviços.

Perante o novo orçamento de Estado, e o anunciado aumento de custos na saúde, sinto no entanto a necessidade de reforçar a seguinte ideia; só é admissível a existência destes custos se se cumprir o seguinte:

- Isenção dos mesmos para as pessoas que efectivamente não os possam pagar; neste momento, não estou certo de que os limites de isenção sejam realistas;

- Esforço efectivo de combate à fraude e evasão fiscal; muito tem sido feito no âmbito dos trabalhadores por conta de outrem, onde este combate é mais fácil e consiste praticamente só no cruzamento eficaz da informação disponível; mas não vejo medidas concretas para os trabalhadores por conta própria, empresários individuais, Empresas;

- Melhoria da qualidade de serviço ao Cidadão/Cliente; pedir às pessoas que paguem mais pelo mesmo é imoral e só leva a uma sensação generalizada de injustiça, de todo indesejável;

- Estabelecimento, nos casos em que tal seja necessário, de um limite máximo a pagar por contribuinte e ano, para evitar, por exemplo, que uma doença crónica ou prolongada ou um agregado familiar numeroso tenha despesas excessivas na saúde ou educação;

- Dedutibilidade fiscal de todas estas despesas.

Sem estas medidas que poderiam justificar perante os cidadãos o aumento de despesa, receio bem que todos nós nos sintamos pura e simplesmente roubados pelo Estado e Governo. Admito que em nome de boas intenções e necessidades reais, mas roubados ainda assim.

quinta-feira, outubro 12, 2006

CLUBES E SELECÇÕES

Cada vez mais se agudizam os conflitos de interesses entre os clubes profissionais de futebol e as selecções nacionais. Todos ralham e, creio, todos têm razão, ou pelo menos todos têm as suas razões.

Há muito que venho reflectindo sobre este tema, e creio que há que corrigir algumas coisas para evitar alguns exageros que a actual primazia das selecções defendida pela FIFA provoca.

Proponho algumas medidas de carácter estritamente desportivo, que a seguir detalho.

Há também as questões financeiras dos seguros, da indemnização dos clubes por lesões contraídas ao serviço das selecções, etc., questões essas que não vou tratar neste texto.

1) Uniformização de competições

Neste momento, as Confederações continentais são soberanas na definição das suas competições internas.

Isso leva a algumas situações de disparidade e injustiça que creio deveriam desaparecer.

Por exemplo, o Campeonato Africano de Nações disputa-se cada 2 anos, incluindo anos de Mundial, quando todos os outros Continentes têm campeonatos cada 4 anos e desfasados do Mundial.

Na Europa, que tem mais de 50 países federados, uma selecção disputa no máximo 12 a 14 jogos numa fase de qualificação para o Europeu ou Mundial. Mas na América do Sul a fase de qualificação para o Mundial engloba os 14 países num sistema de poule, ou seja, 26 jogos de qualificação, numa federação com um quarto ou menos dos países da Europa, África ou Ásia.

Proponho que a FIFA intervenha no sentido de uniformizar as competições e fases de qualificação dos vários continentes, de forma a evitar desigualdades de tratamento e carga de jogos entre os jogadores dos vários continentes, e por arrasto os seus clubes.


2) Utilização de jogadores jovens


Sempre que surge um jogador de talento acima da média com 17/18/19 anos, surge o flagelo da sua utilização em selecções de múltiplos escalões (Sub-18, Sub-19, Sub-21, quiçá uma experiência na Selecção A, etc). Mais uma vez esta situação cria uma sobrecarga de jogos para estes jogadores e prejudica os clubes ainda mais porque as competições dos chamados “escalões jovens” não têm calendários coordenados com as competições profissionais.

Proponho o seguinte.

As selecções seriam divididas por escalões:

- Escalão A – Selecção A
- Escalão B – Selecção B, Olímpica e Sub-21
-Escalão C – Selecção Sub-20 e Sub-19
- Escalão D – Sub-18
etc.

As regras de utilização de jogadores até 23 anos seriam:

- Após uma utilização numa selecção de um dado escalão, um jogador não pode voltar a ser utilizado em selecções dois ou mais escalões abaixo;
- Após 5 utilizações numa selecção de um dado escalão, não pode voltar a ser utilizado em selecções de qualquer escalão inferior.

Exemplo: um jovem talento de 18 anos, após a primeira chamada à selecção Sub-21, não pode voltar a ser utilizado na selecção de Sub-18; e após a quinta chamada aos Sub-21, deixa também de poder ser utilizado nas selecções de Sub-20 e Sub-19.

Para além disto, jogadores com contrato profissional nos seus clubes só poderiam jogar nas selecções de Escalão A e B.


3) Condições de cedência de jogadores pelos clubes


Os clubes não deveriam ser obrigados aceder jogadores à selecção quando se verificasse uma das seguintes condições:

- O jogador atingiu um valor limite total (a definir) de jogos pela selecção num dado ano (excluindo as fases finais de campeonatos oficiais de nações)
- O jogo é particular e o jogador atingiu um valor limite (a definir) de jogos particulares pela selecção num dado ano;
- O jogo é de carácter promocional ou de exibição (no caso em que a selecção recebe um cachet pela participação, ou jogos ou competições em que selecções competem com equipas que não são selecções nacionais).

Em contrapartida, deveria também ser estabelecido um valor máximo de jogos pelo clube que cada jogador pode disputar, para defesa das selecções e dos atletas. E os clubes não poderiam utilizar os seus atletas, mesmo em jogos particulares, nos 30 dias antecedendo fases finais de campeonatos oficiais de nações (atletas convocados para essas fases finais, obviamente).

Os calendários da competições de clubes seriam revistos tendo isto em conta e no sentido de maximizar a defesa dos interesses dos clubes.

terça-feira, outubro 10, 2006

O MAU FEITIO É CRIME

Confesso: tenho mau feitio. Irrito-me com facilidade. Irrito-me sobretudo quando sou mal atendido ou mal servido em locais onde pago para ter precisamente o contrário, ou seja, em locais onde sou cliente e como tal devia ser tratado.

Em Portugal, isto é muito mal visto. Em Portugal, as pessoas são “compreensivas” e “aceitam” tudo que lhes fazem e dizem. Uma palmadinha nas costas, um “amigo tenha paciência”, e tudo se resolve. Podem depois, pelas costas, resmungar e chamar nomes a quem os lesou ou maltratou, mas na hora, na cara do”outro”, ninguém se irrita. Até o Dr. Jorge Sampaio, antecessor do Sr. Silva nesse cargo vazio e inócuo a que se chama Presidência da República, era criticado por se irritar. Penso que ele me compreenderia.

Aqui, se alguém é mal atendido ou até lesado numa loja, restaurante, repartição pública, etc, e não aceita de “cara alegre” as eventuais desculpas da parte contrária, logo os papéis se invertem; o prevaricador assume imediatamente ares de ofendido e de seguida riposta “não se irrite”; “não há necessidade de falar assim”, “eu já lhe expliquei o que aconteceu”, e etc.

Situações destas já me aconteceram muitíssimas vezes. Não sei se atraio más energias, ou se pura e simplesmente não me consigo calar, e como a incompetência e falta de profissionalismo são o que mais se encontra por aí, pois logo tenho a paga da minha intransigência.

Não resisto a contar a última que me aconteceu, no decorrer dos últimos oito dias. Serve de ilustração e desabafo. Catárquico. Com as minhas desculpas por trazer para este blog algo de tão particular, mas não resisto. Estou demasiado irritado ainda.

Numa lavandaria da “5 à Sec”estragaram-me um casaco. Assumiram de imediato a responsabilidade, e por aí não viria grande mal ao mundo. É incompetência, mas nada a fazer.

O pior foi quando perguntei pelo dinheiro do reembolso e me explicaram os procedimentos definidos que eu “teria”, na opinião deles, de respeitar. Teria de apresentar uma factura (que obviamente não possuo, ao fim de um ano), entregá-la na loja, esta envia a mesma para o escritório que “depois” procederia ao pagamento. E a Directora estava no estrangeiro pelo que eu teria de “compreender” e esperar uns dias para que ela voltasse.

Obviamente, irritei-me. Barafustei, falei alto (eu falo alto naturalmente, e quando me irrito ainda mais; isto é considerado ainda uma agravante à já de si criminosa irritação), exigi que o dinheiro me fosse entregue de imediato.

Finalmente consegui, uns dias depois, mas não sem que tivesse de aturar os maus modos da empregada, que ainda por cima me grita quando me ia embora “Não volte cá mais!”.

Perante tão extraordinária atitude, reclamei por fax junto da “5 à Sec”. Mal sabia eu que o mais extraordinário estava para vir. Recebo por mail a resposta desta empresa, basicamente dizendo que eu é que era mentiroso porque ninguém tinha sido incorrecto comigo, que eu é que devia ter seguido os tais procedimentos, e, pasme-se!, eu é que era mal educado e mal formado (nestes exactos termos) porque me tinha irritado, levantado a voz e exigido o dinheiro.

Assim vamos nós. O mau feitio não compensa. Reclamar é inútil. “Respeitinho”, é o que é preciso. Mas Respeito, nem vê-lo.

Contra isto, que fazer?

segunda-feira, outubro 09, 2006

A LIGA E A ARBITRAGEM

Segundo li hoje num jornal, Hermínio Loureiro propõe algumas medidas para a arbitragem que em meu entender merecem total aplauso.

Uma é a possibilidade dos árbitros falarem no final dos jogos aos meios de informação. Acho bem. Numa altura em que todos os agentes do futebol falam, às vezes até demais e a destempo, porque é que só os árbitros têm de permanecer calados? O silêncio só alimenta a especulação e permite a suspeita. Quem fala, se está de boa fé, explica-se; se não está, em geral afunda-se.

Refere também a notícia o objectivo de profissionalização dos árbitros num prazo de quatro anos. Este é sem dúvida o mais importante objectivo de todos os já falados para a arbitragem. Como é possível que num negócio que movimenta milhões, um dos seus agentes mais importantes permaneça no semi-amadorismo? Veja-se o exemplo das Ligas profissionais dos EUA, onde os árbitros há muito que são profissionais.

Só espero que este prazo anunciado não venha a ser sucessivamente adiado. E que o anunciado profissionalismo seja a sério, com condições compatíveis com o nível do profissionalismo de jogadores e treinadores da Liga portuguesa, e não um profissionalismo envergonhado que não resolveria os problemas. Falando claro: bons ordenados, formação profissional adequada, meios técnicos tão avançados quanto o permitam os regulamentos, sistema de avaliação e carreiras tão justo quanto possível. E, já agora, possibilidade de contratação de bons árbitros estrangeiros, se isso se verificar necessário.

Finalmente, anuncia-se que vão ser tornados públicos os relatórios quer do árbitro quer dos observadores. Excelente! O secretismo só favorece a dúvida, o compadrio, as jogadas menos claras. Democracia é transparência. Divulguem-se pois estes relatórios.

Parece começar bem o mandato de Hermínio Loureiro, de quem já aqui eu disse muito mal a propósito do seu inexplicável silêncio sobre o “Caso Mateus”.

Aguardemos para ver o que se segue, nomeadamente a posição da Liga sobre o “Apito Dourado”. Para já, ainda é possível ter esperança de que algo vá mudar. As dúvidas surgem quando vejo o major do costume em todo o lado, nomeadamente sentado ao lado de Hermínio Loureiro a ver o jogo da selecção. Mas pode ser que…

quarta-feira, outubro 04, 2006

NOTAS SOBRE O SISTEMA EDUCATIVO

Assisti ontem na RTP ao programa muito interessante com Maria Filomena Mónica, onde ela tece uma série de considerações que me parecem muito pertinentes sobre a educação em Portugal, e daí me veio a vontade de escrever também algo sobre o tema.

Desde já ressalvo que não sou nem pretendo ser um especialista ou sequer estudioso sobre o tema. Mas tenho algumas opiniões e ideias que aqui deixo para partilha e discussão, esperando que algumas delas não sejam completamente inúteis.

Penso que na medida do possível o sistema educativo deve responder às necessidades dos alunos e deve ser exigente na medida em que eles sejam capazes de responder. Não deve nem marginalizar os menos capazes, nem refrear os mais dotados.

MFM referiu, e bem, que o actual sistema tem “medo das elites”. Estou absolutamente de acordo, e tal como ela também não percebo porquê. Não sei em nome de que “ideia de esquerda” este conceito se enraizou e expandiu.

Entendo que as ”elites” (assim mesmo, com aspas propositadamente) não devem ser temidas nem reverenciadas. Até porque não há “elites” absolutas. Há elites em determinadas áreas de actividade ou de conhecimento ou de capacidade económica ou de poder etc. e os seus membros não são os mesmos.

Penso que todas as elites que nasçam do mérito devem ser encorajadas (o que não quer dizer endeusadas nem mitificadas) porque podem ser, ou deveriam ser, nas suas áreas, a locomotiva que puxa o resto do comboio, se me permitem a metáfora algo fácil.

Igualdade não é igualitarismo acéfalo. Se há crianças e jovens com capacidades acima da média para determinadas áreas de estudo, essas capacidades devem ser desenvolvidas acarinhadas e aproveitadas para que essas pessoas possam ser no futuro profissionais competentes.

Não se desenvolvem competências com “formação” indiscriminada. “Formar” alguém em áreas para as quais não tem nem apetência nem capacidade é uma inutilidade total. O que me parece útil e inteligente é formar as pessoas, seja no ensino secundário, superior, técnico ou na formação profissional, de forma a que se desenvolvam e maximizem as capacidades de cada um.

Um sistema de ensino que trata toda a gente por igual, acaba inevitavelmente por nivelar por baixo. Não porque as pessoas sejam estúpidas, mas porque encontrar o máximo denominador comum entre dezenas de milhar de jovens em n matérias diversas leva inevitavelmente a esse resultado, porque ninguém pode ser bom em tudo e toda a gente tem pontos fracos.

Não tenho infelizmente soluções na manga, nem creio que ninguém tenha. Mas se se mudar o paradigma é um começo, e provavelmente um começo indispensável e inadiável para a obtenção de resultados válidos para as pessoas e para a sociedade em que se inserem.

segunda-feira, outubro 02, 2006

V FOR VENDETTA

Vi há dias “V for Vendetta”, recentemente editado em DVD e que não tinha visto na estreia.

A Graphic Novel de Alan Moore e David Lloyd é uma das mais importantes da renovação da BD anglo-saxónica do final dos anos 80 e inícios dos 90. "V for Vendetta" sucede na obra de Alan Moore a "Watchmen" e antecede "The Killing Joke", uma história de Batman feita já para a DC Comics americana, e que com "The Dark Knight Returns" de Frank Miller abriu para a personagem do morcego justiceiro caminhos antes insuspeitados.

O filme aproveita toda a ideia de base, ou seja, um justiceiro terrorista que luta contra o regime fascista que tomou conta do Reino Unido num futuro não muito distante.

A história em si não é exactamente a mesma, e a personagem feminina tem no filme uma importância bastante maior que na BD.

O filme, apesar de algumas facilidades estilísticas muito “MTV”, é eficaz no retrato do ambiente vivido num regime totalitário onde a repressão está sempre presente, sob a capada normalidade e tranquilidade, num ambiente asséptico de “lei e ordem” de onde estão excluídas a diferença, a cultura, a dúvida, a sinceridade. A televisão, grande sustentáculo do regime, transmite alternadamente propaganda sob a forma de notícias e programas estupidificantes. Faz-vos lembrar algo?

Como contraponto a este mundo aparentemente ideal construído pelo regime, temos os “santuários” de memória e cultura construídos quer por “V”, o terrorista, quer pelo director da estação de televisão, um homossexual que não se pode assumir porque a homossexualidade é crime, e que acaba executado porque tem em casa uma cópia do Corão.

Muito interessante é a personagem do inspector de polícia, membro do partido e leal à situação, mas que não recua no seu propósito de busca da verdade. Os ambientes onde se move são-nos dados com um "look" muito próximo das habituais séries televisivas policiais britânicas, de uma forma muito realista, por vezes sórdida, longe do brilho por vezes artificial das congéneres americanas.

No contexto actual o filme é corajoso, já que a personagem principal, o seu herói, ou anti-herói, é um terrorista assumido que luta contra uma situação que ele vê como opressora; e o seu objectivo é, num dia determinado, a destruição de um edifício. O paralelismo é óbvio.

Mas se o filme não recua perante temas controversos, nomeadamente a assumida defesa da violência como arma política legítima, também não santifica "V", que paralelamente aos seus objectivos políticos tem também uma agenda pessoal de vingança executada através do assassínio contra os responsáveis pela sua prisão e tortura anos antes.

Não sendo uma obra-prima, penso que é um filme que merece mais do que o silêncio a que foi votado quando da sua passagem em sala.