segunda-feira, outubro 22, 2007

Henry King

Começou na 6ª feira passada na Cinemateca o ciclo dedicado ao realizador Henry King. Finalmente consegui ver em sala “The Gunfighter”, por muitos considerado a sua obra-prima e que só tinha visto em televisão.

The Gunfighter é de facto uma obra-prima, e Gregory Peck tem uma das melhores interpretações da sua carreira, mesmo ostentando um bigode que lhe modifica propositadamente a imagem de galã e que só existe por vontade de King contra tudo e todos, incluindo Peck e o produtor. O filme é um melodrama disfarçado de western, ou um western com alma de melodrama, não sei bem. O começo é clássico no western; o cavaleiro solitário, a chegada à cidade, o saloon, o duelo , a morte do seu desafiador, a perseguição pelos irmãos. Mas depois Ringo dirige-se a outra cidade, para reencontrar a mulher e o filho, no que é quase uma antítese do regresso de Ulisses a Ítaca. Ao contrário de Ulisses, que esconde quem é para melhor se vingar, Ringo revela imediatamente a sua verdadeira identidade, e é a mulher que, amando-o, primeiro se recusa a vê-lo; e quando finalmente cede, a efémera promessa de futuro é cortada pela morte anunciada de Ringo. Não é Ulisses que mata os pretendentes, é o pretendente que mata Ulisses/Ringo. Só após a morte Ringo reconquista realmente a mulher e o filho; o final, com o “tell him Mrs. Ringo is here”, muito lembra o “I am Mrs. Norman Maine” do “A Star Is Born”.

Henry King é um cineasta que fomos descobrindo aos poucos, ao longo dos anos, pelo menos a sua obra após 1935 – dos mudos só “Tol’able David” foi visto.

Acho que o primeiro filme que vi foi o famosíssimo melodrama “Love is a Many Splendored Thing”, cá chamado “A Colina da Saudade”, com William Holden e Jennifer Jones a cores e em scope em terras do Oriente. Gosto muito, muito deste filme.

Vi depois “The Sun Also Rises”, algo falhada adaptação de Hemingway, tal como a adaptação de Fitzgerald em “Tender is the Night” (que é exibido hoje); melhor me pareceu “The Snows of Kilimanjaro”, que só vi em TV e quero rever.

De “Carousel” só vi meia hora, depois saí, tão mau me pareceu – sobretudo pelos actores/cantores/bailarinos que me pareceram insuportáveis. Mas quero dar segunda oportunidade ao filme – nesse dia tinha visto já as outras duas versões da mesma história, a de Borzage e o “Lilliom” de Lang, e admito que o cansaço tivesse sido mais forte que eu.

Ainda vi o menor mas interessante “ ABell for Adano”; vi em vídeo, gostei mas lembro-me mal, “Ramona” e “Alexander’s Ragtime Band”.

Recentemente vi em DVD o belíssimo Jesse James, mais um western que não o é bem, como “The Gunfighter”; o excelente filme de aviação na 2ª Grande Guerra que é “Twelve O’Clock High”, o divertido “A Yank in the R.A.F.”, e o excelente filme de piratas que é “The Black Swan”, com Tyrone Power e a maravilhosa Maureen O’Hara.

Espero ver tudo o que possa, e agora aguardo ainda com mais expectativa “Beloved Infidel”, único filme de King com a recentemente falecida Deborah Kerr, uma das maiores actrizes de sempre, inesquecível no “Life and Death of Colonel Blimp” e “The Black Narcissus” a ainda em “Tea and Simpathy”.

quarta-feira, outubro 17, 2007

Directas sim...

“Directas, sim… eu declaro morte ao sol”, cantava Rui Reininho aqui há uns largos anos, num trocadilho inspirado no slogan “Directas Sim” que no Brasil exigia a eleição por sufrágio directo e universal do Presidente da República e o consequente fim da ditadura militar.

Tantos anos depois, a febre das directas chegou aos dois partidos da direita parlamentar portuguesa. Há uns meses, no CDS-PP, o então líder Ribeiro e Castro foi substituído pelas bases por Paulo Portas, então ex e futuro líder, numa aposta numa linha mais populista. Há uns dias, no PSD, a história repete-se, com Marques Mendes a ser substituído pelo também aparentemente mais populista Luís Filipe Menezes (nunca sei se é com “z” ou com “s”).

Alguma coisa mudou, realmente, nesses partidos e na política portuguesa em geral?

No fundo, muito pouco. O CDS é hoje um partido residual, e embora Portas faça mais barulho que Ribeiro e Castro isso não parece fazer crescer o partido nem lhe devolve a importância que há muito não tem na sociedade e na política portuguesas.

No PSD, mal chegou ao poder Menezes parece ter-se “civilizado”, no sentido de ter evitado rupturas e se ter rodeado de um conjunto de figuras vindas de algum passado cavaquista com o que parece ser um objectivo de “evolução na continuidade”. A oposição de Pacheco Pereira e Marcelo Rebelo de Sousa são um “fait divers”, e os apoiantes de Marques Mendes em breve engrossarão as fileiras dos apoiantes do novo líder, a bem da estabilidade do partido e da sua própria carreira política.

O PSD sempre foi um partido ideologicamente difuso, albergando pessoas de tendências políticas diversas dentro do que se pode chamar uma “grande família” que vai desde social-democratas moderados até declarados conservadores. Foi muito por isso que o CDS dificilmente cresceu muito, com a maioria do seu eleitorado natural a sentir-se perfeitamente cómodo no PPD depois PSD. Mas também por isso sempre o PSD sentiu dificuldades quando o PS, por vocação, interesse ou necessidade, (ou seja, sempre que esteve no poder), acabou por ocupar muito do que seria o seu (do PSD) espaço natural e deixar este partido sem causas que o diferenciassem.

De facto, o PSD só foi realmente forte quando teve líderes fortes que o moldaram à sua personalidade e colocaram a máquina do partido ao serviço dos seus projectos políticos. Ou seja, claramente, o PSD só foi forte com Sá Carneiro e com Cavaco Silva. Homens que tinham uma visão pessoal da política e do país, e que com isso conseguiram arrastar uma parte significativa do eleitorado para a bandeira do PSD e levar por arrasto o partido ao poder. Obviamente, havendo poder a máquina do partido e o seu lote de barões alinha-se automaticamente com o líder, se não por lealdade pelo menos por conveniência.

Sem esse líder forte, o PSD não existe. Ou melhor, existe como “sombra” do PS, e pela influência dos seus líderes do poder local, onde as disputas entre A e B são mais pessoais que ideológicas ou partidárias. Mas numa eleição nacional dificilmente têm a força para ganhar, ficando com o eleitorado que ou antipatiza com o líder do PS do momento, ou é demasiado conservador para encarar votar num partido que continua a afirmar-se “socialista” (é claro que Durão ganhou, mas numa situação peculiar em que o líder do PS no poder, António Guterres, desistiu de governar e fugiu a sete pés; mas logo a seguir o próprio Durão o imitou e retribuiu a gentileza, devolvendo o poder ao PS).

De resto, entre Durão e Santana, Mendes e Menezes, todos os líderes se equivalem e nenhum irá mudar esta realidade de base. Ate aparecer o próximo “homem providencial” que arraste novamente o eleitorado consigo, e por arrasto o partido também.